São Paulo, Quarta-feira, 12 de Janeiro de 2000


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Quanto vamos crescer?

ANTONIO DELFIM NETTO

Um dos exercícios mais fúteis a que se dedicam os economistas é o de tentar prever com absoluta exatidão as taxas de crescimento do PIB, da inflação, do saldo comercial e assim por diante. Ninguém no Brasil tem um modelo razoável de como funciona a economia. Na segunda semana de janeiro dispomos de pelo menos 16 "previsões", feitas por instituições financeiras e consultores, assim distribuídas com relação ao crescimento do PIB e ao saldo da balança comercial:
De onde saíram tais números? A previsão do PIB é, obviamente, uma previsão de crescimento de demanda. Ora, a demanda tem quatro componentes: o consumo, o investimento, os gastos do governo e a demanda externa líquida. Deixado de lado o último componente, que obviamente vai crescer sobre todos os outros, paira o mais absoluto mistério. Tais previsões, portanto, só podem ser aceitas como questão de fé! Quando se analisam os números, encontram-se inúmeras dificuldades. Em algumas, sobe a taxa de crescimento do PIB juntamente com a taxa de juro real! O quadro abaixo mostra a relação entre as duas variáveis nas 16 "previsões":
Não deixa de ser curioso que 13 analistas estimem um crescimento entre 3% e 4%, com taxas de juros reais que vão de 4% a 12%!
Nenhum desses números tem fundamento, quer tenham sido revelados no tarô ou por métodos econométricos sofisticados, pela simples e boa razão de que o Brasil em 2000 não será a continuação do Brasil de 1999. Há, por exemplo, três programas em andamento (um na Caixa Econômica Federal, outro no BNDES) para o saneamento financeiro de pequenas e médias empresas, que, se forem levados adiante, podem modificar dramaticamente o quadro produtivo nacional. O terceiro é o magnífico Refis proposto pela Receita Federal, que será aperfeiçoado no Congresso. Ele pode ser uma revolução naquele mesmo sentido.
Na contracorrente temos a resolução nº 2.682 do Banco Central, que exagera (mais uma experiência do FMI?) na necessária regulamentação prudencial do sistema bancário e que parece excessivamente dura e prematura. Se posta em prática com a velocidade pretendida, pode anular boa parte daqueles programas. Ela vai reduzir o volume de crédito para empresas em dificuldades, mas que poderiam recuperar-se (não são "evergreen loans") e produzir taxas de juros diferenciadas pela exigência de provisões calculadas na base de "ratings" mais do que discutíveis. Ela pode, de fato, abortar o aumento tão necessário da liquidez para a recuperação financeira das empresas.
O que vamos crescer em 2000 está, infelizmente, inscrito nas ações aleatórias de burocratas independentes. Coordenadas, elas talvez pudessem proporcionar a boa surpresa de um robusto e insuspeitado crescimento estimulado por mais financiamento a menores taxas de juros.


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.


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