São Paulo, terça-feira, 12 de janeiro de 2010

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Fome de investimento

Resgate da dívida social em prazo aceitável exige do Estado bem mais que vistosos programas de cunho assistencialista

O PROGRAMA Fome Zero, peça de resistência da propaganda do primeiro período Lula na Presidência, completa sete anos como mero apêndice do Bolsa Família, verdadeiro carro-chefe do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
O saldo dos seis primeiros anos do Fome Zero são 129 restaurantes populares construídos. Em contraste, 12,4 milhões de famílias já recebiam no final de 2009 de R$ 22 a R$ 200, a renda complementar que substituiu cartões para compra de alimentos.
O foco em segurança alimentar, um problema localizado, como base para eliminação da pobreza foi abandonado, corretamente. Os méritos do Bolsa Família, por sua vez, já cedem lugar ao reconhecimento crescente de suas limitações. Muito dos avanços sociais que a ele se atribuem resultam de um processo mais longo de desenvolvimento, com efeitos cumulativos.
Tome-se o acesso dos 25% mais pobres da população à rede de esgotos ou a fossas sanitárias: passou de 32,3% em 1996 para 41,1% em 2002, no final do período FHC, e para 52,4% em 2008, sob Lula -portanto, com taxas similares de melhora. A virtual universalização do ensino fundamental, com 97% das crianças na escola, data de 2003.
Algumas das raízes desse progresso linear se encontram no ciclo econômico, que remonta à abertura da economia brasileira e ao controle da inflação, nos anos 1990. Outras, na Constituição de 1988, com a generalização da aposentadoria rural e da saúde básica. Outras, ainda, na demografia, com a acentuada redução da fecundidade a partir da década de 1960.
Reconhecer aqueles avanços é muito diverso, contudo, de concluir que tudo esteja resolvido ou bem encaminhado no campo social. De um lado, a universalização do ensino e do atendimento à saúde convive com sua má qualidade. De outro, é vergonhosamente lento o ritmo de melhora nos indicadores sociais que dependem de investimento em infraestrutura.
Nenhum governo pode vangloriar-se por ter quase a metade da população pobre desconectada de esgotamento sanitário adequado. No Brasil, estima-se que de 6 milhões a 8 milhões de famílias ainda carecem de habitações apropriadas. São cifras de país subdesenvolvido -e injusto.
Só com programas assistencialistas, sejam eles criados por Lula ou FHC, o Brasil não resgatará essa dívida. Para isso, o Estado tem de recompor a capacidade de investir -com recursos e melhor gestão- e de eliminar os entraves para que o setor privado assuma parte maior no esforço.


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