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Casa do espanto
Caso do pagamento de horas extras no Senado mostra uma instituição enclausurada em interesses corporativos
CORREDORES que não levam a lugar nenhum, salões vazios que se sucedem ao infinito, passagens secretas, labirintos e criptas, com seus permanentes ou
eventuais fantasmas, tornam
misteriosa a arquitetura de qualquer castelo, pouco importa se
localizado no próspero interior
de Minas Gerais ou nas altitudes
sombrias da Transilvânia.
Não parece haver exemplo
mais desnorteante de edificação
do gênero, contudo, do que um
complexo conjunto de concreto
e vidro instalado na paisagem
vasta e planejada de Brasília.
Não é preciso visitar pessoalmente o Congresso Nacional para ter, antes de tudo, a visão de
seus salões desabitados. No plenário do Senado, no plenário da
Câmara, decisões legislativas importantes contam-se nos dedos;
nenhuma se registrou, aliás, desde o começo do ano.
A impressão de abandono em
parte se desmente, todavia,
quando se constata a febril atividade em torno dos assuntos internos à instituição.
Foi intensa a disputa, no início
do ano, em torno das Mesas Diretoras. Seguiu-se a luta pela
presidência das Comissões. Discute-se ainda a questão das verbas indenizatórias reservadas
aos deputados e senadores.
Na Corregedoria da Câmara
dos Deputados, estudam-se formas de punir o deputado Edmar
Moreira (sem partido-MG), celebrizado pelo castelo que construiu em Minas. Em fevereiro o
deputado havia sido eleito presidente do próprio órgão que, agora já sob nova chefia, cuida de investigá-lo.
À sensação de um círculo vicioso soma-se nestes últimos dias o
caso fantasmagórico do pagamento de horas extras para 3.883
funcionários do Senado Federal,
pelo trabalho suplementar que
teriam tido no mês de janeiro.
Mas em janeiro não houve atividade parlamentar. O mistério
cresce: não se conhece a quantia
exata (R$ 6,2 milhões? R$ 8 milhões?) do que foi gasto com essa
liberalidade.
Mais assombroso, não há responsáveis à vista pela decisão.
Foi o senador Efraim Morais
(DEM-PB) quem autorizou a
despesa, três dias antes de deixar
a primeira secretaria da Casa.
Mas afirma que seguiu as solicitações dos chefes-de-gabinete de
cada senador.
Eis que alguns dos próprios senadores se espantam, ao saber
que servidores de seus gabinetes
se beneficiaram da medida.
Responsável por tomar providências, o senador Heráclito
Fortes (DEM-PI), a quem coube
suceder seu correligionário
Efraim Morais no posto de primeiro-secretário, declara que
pediu um parecer sobre o caso ao
advogado-geral do Senado. Aos
jornalistas, mostrou-se inconformado com a denúncia: "Parem com isso. A coisa vai chegar
aonde?"
Eis o único enigma de fácil resposta. Não chegará a nenhum lugar, exceto o que já se sabe: mais
desgaste para o Legislativo, em
meio a uma situação mais grave e
profunda do que qualquer escândalo pontual: a incapacidade de
deputados e senadores de exercer suas reais atribuições, propondo e votando matérias de relevo para o país.
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