São Paulo, segunda-feira, 12 de abril de 2010

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MARINA SILVA

Plano de fuga

UM MILHÃO e meio de brasileiros se manifestaram favoravelmente ao projeto de lei de iniciativa popular apresentado ao Congresso em 2009, que impede o registro como candidato de pessoa condenada em primeira ou única instância ou, ainda, com denúncia recebida por um tribunal em virtude de crimes graves como racismo, homicídio, estupro, tráfico de drogas e desvio de verbas públicas. É o chamado projeto Ficha Limpa, que altera a Lei das Inelegibilidades.
Promovido pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), tem encontrado muita resistência no Congresso. Na semana passada, por decisão dos líderes partidários que representam a maioria, não foi votado em plenário, mas enviado para a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara, o que pode inviabilizar a aplicação nesta eleição.
O que os parlamentares não entenderam ainda é que a proposta fala pelo sentimento da maioria da população: a política, fundamental para a vigência da democracia, precisa ser exercida às claras por bons cidadãos, capazes de mediar os interesses da sociedade, no âmbito do Estado, movidos pelo objetivo do bem comum.
Há quem ache injusto ou veja nisso uma limitação à defesa ou até mesmo da soberania popular, que teria o poder de "inocentar" nas urnas os eleitos. Mas a política não pode ser local de refúgio para quem busca impunidade, quer fugir da Justiça ou visa privilégios pessoais.
Hoje, o melhor plano de fuga para protelar e paralisar processos judiciais não passa pelo aeroporto, mas, paradoxalmente, pela eleição a um cargo político.
A seleção de candidatos de "ficha limpa" deveria começar nos próprios partidos. O Partido Verde aprovou a Resolução 1/2010, impedindo a candidatura de pessoas condenadas por órgão colegiado em crimes de abuso de autoridade, lavagem de bens, contra a vida e a dignidade sexual, contra o meio ambiente e a saúde pública, entre muitos outros.
Não se pode mais ignorar que a desonestidade está, em grande parte, na raiz da ineficiência e até da ausência de serviços públicos vitais, em setores como saúde, educação, habitação, saneamento, segurança pública e proteção ao ambiente.
Por trás de muitos fatos que revoltam os brasileiros está, na verdade, a cultura perversa que transforma o poder político em instrumento para corromper, não para melhorar a vida das pessoas.
Cada centavo do dinheiro público é trabalho de toda a sociedade. Deve ser usado de forma eficiente, justa, técnica e socialmente correta. E, sobretudo, deve estar nas mãos de quem não tem do que se envergonhar.

contatomarinasilva@uol.com.br

MARINA SILVA escreve às segundas-feiras nesta coluna.



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