São Paulo, sexta-feira, 12 de maio de 2006

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ELIANE CANTANHÊDE

Inimigo externo

BRASÍLIA - Ou é sensatez ou é auto-engano, mas o fato é que o governo brasileiro continua reagindo com imensa paciência à agressividade do presidente da Bolívia, Evo Morales.
Tudo vem num crescendo: Morales nacionaliza, joga o Exército nas refinarias, expropria e não quer ressarcir. A mais nova ameaça é simplesmente não indenizar a Petrobras pela expropriação, alegando que o contrato foi "ilegal e inconstitucional".
Mas o Brasil continua bonzinho, achando que a nova investida se encaixa na seguinte categoria: as pessoas falam uma coisa e fazem outra. Ou: Morales fala uma coisa, enquanto seus ministros negociam outra.
Essa interpretação foi colhida na providencial nota conjunta do ministro brasileiro de Minas e Energia, Silas Rondeau, e do de Hidrocarburos da Bolívia, Andres Soliz Rada. Ali há sinais entendidos como bandeira branca, como abrir a discussão de "mecanismos e formas de compensação negociada". Morales disse que não haveria compensação. Seu ministro explicita que haverá.
Enquanto a oposição grita, os críticos esperneiam e há uma forte pressão para o Brasil usar o "porrete", no Planalto e no Itamaraty mantém-se exatamente a mesma postura do início: reagir, sim, mas massacrar, não.
A Bolívia é o país mais pobre da América do Sul, Morales usa a velha estratégia do "inimigo externo" para angariar força política interna em ano eleitoral, e a grande verdade é que o Brasil vive sem a Bolívia, mas a Bolívia sobrevive sem o Brasil?
Numa boa metáfora usada ontem (e não foi por Lula...), é como timinho disputando com timão. Todo mundo torce pelo timinho, que pode dar canelada, enganar o juiz, fazer qualquer coisa. O timão tem de agüentar o tranco e a torcida. Basta fazer o gol na hora certa e vencer.
Apesar do jeito espetaculoso, tudo deve acabar com o Brasil pagando mais pelo gás boliviano, o que é até justo. O problema não é a Bolívia. É a Venezuela, rica e com Chávez cada vez mais voraz e imprevisível.

@ - elianec@uol.com.br


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