São Paulo, sexta-feira, 12 de junho de 2009

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Um dígito


Decisão do BC que tirou um ponto da Selic estimula mudança de hábitos numa economia acostumada a juros altos

NÃO SE vislumbram justificativas técnicas para a "surpresa" demonstrada por analistas de mercado diante do corte de um ponto percentual na taxa básica de juros, realizado anteontem pelo Banco Central. Ora, partiu desses próprios especialistas uma das principais motivações para a fixação da Selic em 9,25% ao ano.
A cada semana, o BC pergunta a um grande número de economistas ligados a bancos e consultorias qual é a sua estimativa para o comportamento dos preços. A média mais recente dessas expectativas prediz que o IPCA, índice que orienta a política de juros, encerre 2009 com alta de 4,3% -marca que se repete nas especulações em torno do índice de 2010.
Como a política econômica estabelece um alvo para a inflação de 4,5% ao ano e dá ao Banco Central o poder de aumentar os juros caso o IPCA ameace subir acima desse ponto, permite também a redução da Selic no cenário oposto. É justamente isso o que acontece agora.
Os técnicos do Copom também verificam, obviamente, outros dados que poderiam indicar que os analistas privados se equivocam em suas previsões. Mas essa série de estatísticas adicionais torna improvável um repique da inflação.
A atividade econômica ainda está fraca, apesar de incipiente recuperação; mantém-se o excesso de capacidade ociosa na indústria; o desemprego se elevou; os preços globais de commodities estratégicas, como o petróleo, ainda estão muito abaixo dos níveis do ano passado; o real se valoriza ante o dólar; os custos de produção sobem muito pouco, quando não se reduzem; os investimentos produtivos das empresas despencam.
Responde a outras razões o ceticismo de alguns acerca do ponto em que o BC poderia chegar no corte da Selic. O Brasil não está acostumado a lidar com juros básicos abaixo de 10% ao ano. Chegou-se a difundir por aqui a hipótese, sem fundamento empírico, de que a economia do país impunha limites estruturais a uma queda dessa magnitude.
A verdade é que o cachimbo dos juros altos entortou a boca de muita gente. Os ganhos elevados em aplicações financeiras de risco insignificante, que eram uma aberração tipicamente brasileira, tornaram-se "naturais".
Daí a importância de o Banco Central ter-se mantido fiel ao seu mandato na decisão desta quarta-feira. Ela estimula uma mudança de hábitos nos agentes domésticos ao indicar que, também na questão dos juros básicos, o Brasil vai deixando de ser uma economia exótica.


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