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RUY CASTRO
Pesadelo cacofônico
RIO DE JANEIRO - Começou. Um
programa de TV, mostrando a adesão do torcedor à Copa, exibiu um
cachorro -um pobre poodle branco- vestido, calçado, tingido e paramentado de verde-amarelo do rabo às orelhas. Devidamente humilhado, e tendo de fazer jus à sua
condição de "melhor amigo", o
poodle não protestou. Mas não parecia levar fé nesta seleção, que é
muito mais de Dunga que dos torcedores e cachorros brasileiros.
Basta sair às ruas para ver como
o Brasil gosta mais de Copa do
Mundo do que de futebol. A desconfiança no rendimento da seleção não impede que prédios e ruas
estejam cobertos pelas cores nacionais, com as bandeiras, fitas e bandeirolas dando às metrópoles um
quê de arraial junino. E o pior é que,
se o Brasil for despachado mais cedo, várias ruas continuarão com o
asfalto colorido por anos, como
uma memória do vexame.
A overdose de verde-amarelo
que nos espera nas próximas semanas será amplificada por elas serem
também as cores da anfitriã, África
do Sul. E, por mais que a Fifa tente
reprimir, não poderá impedir que o
comércio e a propaganda deitem e
rolem com o chamado "marketing
de emboscada", usando símbolos
que lembram a África -um elefante
ou uma zebra verde-amarela, por
exemplo- para caronear os patrocinadores oficiais e associar seus
produtos à Copa.
Mas, por mais massacrante que
seja a onipresença das cores, talvez
possamos abstrair e fazer de conta
que elas não estão em toda parte. Já
da poluição sonora provocada pelas vuvuzelas não será possível fugir. Tive essa certeza outro dia, em
Recife, onde estava a trabalho: um
único marmanjo armado com uma
vuvuzela se fez ouvir por 12 horas
seguidas e em bairros diferentes.
Sei disso porque espiava pela janela do táxi, da van ou do hotel, e era
sempre o mesmo pentelho.
O Brasil inteiro soprando aquilo
será um pesadelo cacofônico.
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