São Paulo, domingo, 12 de julho de 2009

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EMÍLIO ODEBRECHT

Sobre o mau comportamento

O BRASILEIRO sempre foi tido como gentil, amável, conciliador. Será que estamos mudando? Essa pergunta se justifica por comportamentos que venho observando em restaurantes, hospitais, shopping centers, repartições públicas onde se vai para obter algum documento etc. São principalmente reações, as quais têm me deixado surpreso e preocupado.
Acho que precisamos ligar o sinal de alerta porque é cada vez mais comum ver quem está ali para atender tornar-se vítima do descontrole de pessoas mal-educadas, agressivas até, situação que se torna mais evidente quando quem está do outro lado do balcão é um servidor público. Não quero ser condescendente com a incompetência, que precisa ser eliminada com investimentos na capacitação das pessoas por parte de governos e empresas.
Mas considero inaceitável que o despreparo e a desqualificação de um trabalhador sejam motivo ou justificativa para atitudes desrespeitosas por parte do usuário do serviço ou consumidor de determinado produto. Reações desequilibradas não se justificam, e a perda da calma quando o que se exige é tolerância e compreensão revela uma personalidade frágil. Ha quem busque outras explicações -na crise, nas dificuldades momentâneas, até em problemas pessoais. Mas nada disso, também, pode dar guarida a tais comportamentos.
O pior e mais grave é que frequentemente os protagonistas dessas atitudes condenáveis são pessoas de nível educacional e poder aquisitivo visivelmente superiores aos daqueles a quem ofendem, os quais estão ali em busca da sobrevivência, merecendo, portanto, respeito e ajuda, e não xingamentos e grosserias. Por outro lado, não podemos esquecer que em empresas ou órgãos de governo o atendente nem sempre é responsável pelos procedimentos que adota.
Lembro-me de um episódio ocorrido em uma repartição pública em Salvador, em meados de 80. Dezenas de pessoas esperavam a vez de serem atendidas. A certa altura, alguém chega e o rapaz que controlava a fila lhe dá passagem. Depois de algum tempo, surge outro fura-fila, prontamente atendido. No terceiro, uma senhora resolve protestar e diz ao rapaz que vai denunciá-lo a seus superiores.
A resposta vem pronta: acho bom, porque são eles que mandam eu fazer isso. Ou seja: na maioria das vezes, os servidores estão cumprindo ordens. Acho importante refletirmos sobre isso, porque, se a quem serve cabem dedicação e bom senso, o autocontrole e a paciência são virtudes de quem compreende e sabe dar valor ao ato de servir -não apenas ao de ser servido.

EMÍLIO ODEBRECHT escreve aos domingos nesta coluna.



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