São Paulo, segunda-feira, 12 de julho de 2010

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Desindustrialização

É preciso deixar de lado a resignação com que muitos acompanham a preocupante perda de peso da produção industrial na economia

O aumento do ritmo de expansão do PIB brasileiro desde 2007 não pode obscurecer análises mais cuidadosas sobre fragilidades e riscos presentes na economia. Um aspecto importante é a provável perda de terreno por parte da indústria, fenômeno que parece estar em curso, apesar de encoberto pela força da demanda interna, que estimula o crescimento.
Algumas evidências são preocupantes: menor participação no PIB, baixa inovação tecnológica, mau desempenho nas exportações (muito aquém da média internacional, particularmente após a crise) e perda de mercado interno para produtos importados em áreas importantes, como as de bens intermediários e máquinas.
O deficit comercial em segmentos industriais de média e alta tecnologia (química, bens de capital e eletroeletrônica) atingiu cerca de US$ 44 bilhões em 2009, número que deve superar US$ 50 bilhões neste ano. Mesmo em bens intermediários, setor no qual o Brasil há muito é competitivo, a penetração das importações tem aumentado com rapidez.
Há nesse fenômeno aspectos positivos que devem ser reforçados, tais como controle da inflação e incremento da concorrência e da produtividade. Mas é preciso considerar que a indústria brasileira não compete em condições isonômicas, premida pela alta carga tributária e outras mazelas. E não se pode perder de vista que a internacionalização das cadeias de produção é um processo lento; uma vez estabelecido não pode ser revertido facilmente.
Muitos argumentam que a preocupação com a indústria é equivocada e que o Brasil poderia construir um modelo econômico baseado em agroindústria de ponta e serviços com alto valor agregado. Ocorre que esta é uma estratégia um tanto arriscada no estágio atual de desenvolvimento do país. A história não traz muitos exemplos de economias que convergiram para esse modelo de especialização -especialmente na área de serviços- quando tinham renda per capita baixa ou média (por exemplo, em torno de US$ 10 mil por ano, como é o caso brasileiro).
Para tanto, seria necessário contar com mão de obra altamente produtiva, o que ainda é um problema no Brasil.
Ganhos de produtividade também são mais difíceis no setor de serviços em comparação com o que pode ocorrer na indústria, como é evidente até em alguns países desenvolvidos, como a Alemanha e o Japão.
A não ser que se instale uma verdadeira revolução educacional, é provável que um modelo baseado em consumo, especialização em serviços, câmbio valorizado e deficit crônicos em conta corrente mostre-se insustentável no médio prazo. Em outras ocasiões, o Brasil já se viu atropelado pela realidade ao hesitar em tomar as medidas necessárias.
Embora os riscos não sejam imediatos, é preciso combater a resignação que cada vez mais parece se instalar no país a respeito da perda de peso da indústria.


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