São Paulo, sábado, 12 de agosto de 2006

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Em ponta de faca

Enquanto o crime organizado aperfeiçoa suas técnicas rumo ao terror, polícia ainda comete erros básicos

A FACE mais perversa da repetição freqüente das ondas de ataque do crime organizado em São Paulo não está nos sinais de que a população vai construindo maneiras de conviver com a nova ameaça. Está na chance de essa reação -esperada e até desejável- vir a ensejar o diagnóstico, falso, de que se esgotaram as alternativas de combate à facção criminosa, supostamente incorporada em definitivo ao cotidiano paulista. Essa resignação só faria encobrir a incapacidade das forças de segurança do Estado e do país em cumprir seu dever de debelar a organização criminosa.
Na melhor das hipóteses, o que houve na madrugada de segunda-feira foi a repetição de uma falha básica da parte da Secretaria da Segurança Pública, incapaz de mensurar a extensão e o poder de fogo do PCC. Mais de três meses após os primeiros ataques, são fortes os indícios de que a polícia foi mais uma vez apanhada de surpresa.
A informação mais acurada de que dispunham, segundo o governador Cláudio Lembo, era sobre a possibilidade de atentados no Dia dos Pais. Que, a essa altura dos acontecimentos, a tática dos criminosos de atacar "fora da data prevista" seja usada como justificativa é dado revelador da forma desorientada com que o problema tem sido enfrentado.
Não tem melhores implicações a versão, aceita pela polícia, de que a correia de transmissão para a terceira onda de violência tenham sido parentes de líderes do chamado PCC. Durante visita aos presídios do oeste paulista, no domingo, teriam recebido as ordens do ataque e as retransmitido na chegada à capital, na madrugada de segunda-feira -escapando dos grampos da polícia. Um procedimento tão rudimentar não deveria ser capaz de driblar a vigilância policial.
Tão logo eclodiram os primeiros ataques, em maio, a necessidade de cortar a comunicação entre a cúpula da facção delinqüente e sua base apresentou-se como medida prioritária e consensual. Mas os esforços para implementá-la foram insuficientes. Embora parcela expressiva dos líderes da quadrilha tenha sido isolada em Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), não há nenhuma notícia alvissareira no sentido de que o poder público tenha logrado cumprir um papel básico: frustrar suas comunicações com o exterior.
A julgar pela eficiência e coordenação dos ataques desta semana, o fracasso em silenciar a comunicação entre líderes e comandados não foi a única falha da ação preventiva da polícia. A logística da quadrilha, articulada a ponto de deflagrar ações em diversas cidades poucas horas após o comando, continua imune aos serviços de inteligência policiais.
É triste constatar que continua em franco desenvolvimento o aprendizado dos bandidos no sentido de aproximar-se, a cada novo ciclo de ataques, do perfil de uma organização terrorista, que espalha o pânico atingindo aleatoriamente alvos civis. Pior é olhar para a força pública e observar que o ritmo no qual avançam as suas técnicas de enfrentar esse novo inimigo está muito aquém do desejado.


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