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RUY CASTRO
Ao ritmo do coração
RIO DE JANEIRO - Em 1986, um
sociólogo italiano, Carlo Petrini, liderou um protesto contra a instalação de um McDonald's na Piazza di
Spagna, em Roma. Os manifestantes brandiam pratos de penne para
demonstrar sua aversão à fast food:
os cheeseburgers que as pessoas devoram às pressas, de pé, num balcão, babando ketchup e sem consideração pelo próprio estômago.
O McDonald's venceu, mas, daquele ato, nasceu um movimento
pela slow food -para conscientizar
as pessoas a que valorizassem suas
refeições, comendo produtos mais
frescos, se possível regionais, e recuperassem a noção de convívio em
torno de um prato de comida. Aos
poucos, o movimento espalhou-se
pela Europa, infiltrou-se no próprio
QG do inimigo, os EUA, e até chegou, timidamente, ao Brasil.
Mas o importante é que o princípio da slow food não precisa limitar-se à comida. A cantora Joyce
inspirou-se em Petrini e adaptou
esse princípio à música, em seu novo e belo disco, "Slow Music", cheio
de clássicos antigos e modernos,
que não tocará no rádio. "[Este é]
um álbum feito de silêncios e pausas", diz ela no encarte. "A pausa é
um momento importante da música. Sem silêncio, não existe som.
Sem o claro-escuro, não se veem todas as nuances da cor."
Muitos fatores contribuíram para o ritmo avassalador tomado pela
música popular nas últimas décadas -um ritmo que não condiz com
o batimento cardíaco e que, para ser
tolerado, exige o uso de substâncias
que acelerem tal batimento. Um deles é a nossa omissão. Deixamo-nos
vergar pela tecnologia sonora, pela
mídia e por essa exótica categoria
"artística": os DJs.
Fast food é junk food, como se sabe, e há uma relação óbvia entre
junk food e junk music: se as pessoas comessem a música que a mídia lhes serve para ouvir, já estariam mortas há muito tempo.
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