São Paulo, quarta-feira, 12 de setembro de 2007

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MELCHIADES FILHO

A quebradeira do decoro

BRASÍLIA - As perícias da polícia não foram conclusivas. Não surgiram provas de negócios escusos com o lobista da construtora. Quanto ao favorecimento a uma cervejaria, as apurações implicam mais o irmão deputado. O uso de laranjas na compra e venda de rádios e jornal? Ainda que os indícios pareçam robustos, as investigações pouco avançaram, em virtude da prioridade dada à denúncia original. Tudo o que há sobre a quarta suspeita, de propina em ministérios, é um depoimento do ano passado.
Formalistas e interesseiros já têm esse discurso engatilhado para tentar virar o jogo, protegidos pelo voto secreto e pelo debate fechado no plenário. O ônus é de quem acusa, eles afirmam, alheios ao parecer devastador do Conselho de Ética, que aponta oito irregularidades.
Falta à tropa de choque, porém, elaborar uma justificativa para os pecados que Renan Calheiros cometeu uma vez na berlinda.
Não se trata aqui dos erros táticos do senador (forneceu os documentos que, desconstruídos e desmoralizados, voltaram-se contra ele). Mas da constatação do uso acintoso e desmedido que fez da presidência da Casa para se defender.
Antes reconhecido e mesmo elogiado como um político apaziguador, Renan vergou o Congresso. Arbitrou ele mesmo os apartes e contestações às explicações que produzia à medida que os processos se avolumavam. Escalou e tutelou o Conselho de Ética enquanto pôde.
Pôs a secretária para revisar registros taquigráficos de depoimentos. Patrocinou a idéia de uma CPI para intimidar a imprensa. Ameaçou colegas com o discurso eu-sei-o-que-você-fez-no-verão-passado. Ocultou os empréstimos que, reconheceria mais tarde, bancaram as mesadas de Mônica Veloso. Chamou de "gestante" a mãe da filha -e esta, de "criança".
Por três longuíssimos meses, quebrou não só o seu decoro mas o de todos os senadores, a quem hoje cabe decidir se ele vale o troco.


mfilho@folhasp.com.br

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