São Paulo, terça-feira, 12 de novembro de 2002 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Argumentação e debate LUIZ CARLOS BRESSER PEREIRA
Quando Fernando Henrique
Cardoso assumiu a Presidência do
Brasil, já tínhamos uma democracia
consolidada, mas ele será lembrado como um grande presidente, porque presidiu a transição da democracia de elites
para a democracia de opinião pública.
Finalmente, era consenso na sociedade que, controlada a inflação, era necessário e possível retomar o desenvolvimento. Entretanto, diante da natural limitação dos recursos internos, não mais a opinião pública, mas os economistas e empresários sob influência externa chegaram a um quase consenso de que esse desenvolvimento teria que se basear na poupança externa. E se caminhou nesse sentido. Esta, porém, era uma visão equivocada e mal discutida, explicando-se assim seus resultados econômicos pouco satisfatórios. Em todo o seu governo, porém, o que vimos, sempre, foi a prática reiterada da governança democrática. O respeito à lei e à opinião pública. A observância de princípios éticos rigorosos. A busca do diálogo e da negociação. Havia sempre quem aconselhasse uma atitude mais executiva, que em certas circunstâncias era inevitável, mas esta era a exceção. Como notável sociólogo que é, e democrata convicto, o presidente preferia ouvir a todos e buscar, entre as idéias desencontradas, um vetor que melhor representasse a perspectiva da sociedade. Contribuiu, assim, decisivamente para o avanço da democracia brasileira. Lula nos promete coisa semelhante. Afirma que seu governo será marcado pelo diálogo e pela negociação. E enfatiza a negociação que marcou toda a sua vida, desde que assumiu a liderança dos metalúrgicos do ABC, nos anos 70. Agora a negociação terá que ser feita com toda a nação. Sugiro que mais importantes do que a negociação serão o debate público e a argumentação que nele ocorrer. Na política, a negociação é fundamental. As democracias avançadas combinam os compromissos com os consensos, que são alcançados por meio da argumentação nas diversas arenas do debate público. Para governar, o PT terá uma grande vantagem em relação a partidos mais conservadores. Não precisa recorrer ao populismo para ter o apoio do povo, porque boa parte desse povo sabe que as decisões que estão sendo tomadas são o que melhor se pode fazer pelos pobres. Isto, porém, não elimina o desafio -que é o de todos os políticos democráticos- de convencer a maioria de que se está no caminho certo. Por meio da argumentação no debate público não apenas se logra persuadir o outro, mas se encontram terceiras soluções inovadoras que permitem que as duas partes ganhem. Lula tem insistido que não governará sozinho, mas, para que seu governo tenha o êxito que todos desejamos, é necessário que o debate público e a argumentação se transformem em uma prática generalizada. E que as reformas e as políticas públicas sejam fruto não só do que foi assegurado na campanha eleitoral, mas principalmente desse debate público intenso que as democracias permitem e exigem. Ficou bastante claro, no governo Fernando Henrique, que a qualidade das decisões depende desse debate. Da mesma forma, no governo Lula, o bom desenho das reformas e a competente definição das políticas que se quer implementar melhorarão muito com ele. Luiz Carlos Bresser Pereira, 68, é professor de economia na FGV-SP e professor visitante de teoria política na USP. Foi ministro da Ciência e Tecnologia e da Administração Federal e Reforma do Estado (governo FHC), além de ministro da Fazenda (governo Sarney). E-mail: bresserpereira@uol.com.br Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Oded Grajew: Um pacto pela cidadania Índice |
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