São Paulo, terça-feira, 12 de dezembro de 2006

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CARLOS HEITOR CONY

A roda da história

RIO DE JANEIRO - Há muito perdi o contato com um grupo de feministas que, nos anos 80, pregava a abstinência sexual das mulheres com um argumento irrefutável: "Como ter orgasmo enquanto Pinochet preside uma ditadura sangrenta e corrupta no Chile?".
É bem verdade que Augusto Pinochet deixou o poder, mas continuou poderoso e impune. Por causa disso, as mulheres politizadas não podiam ter orgasmos enquanto a justiça não fosse feita. O tempo passou, não sei onde andam as feministas daquele tempo, Pinochet passou a curtir o seu vinagre e acaba de morrer.
Deixou uma herança amarga e milhares de mortos, desaparecidos e perseguidos, mas deixou também no Chile uma economia estável, a reboque do neoliberalismo que outros países tentam imitar.
Desde Julio César, os ditadores morrem. Uns assassinados, outros de morte natural, sem contar os que se suicidam. Mas as ditaduras são recorrentes. Qualquer bobeada nas instituições democráticas e há sempre um ditador de plantão, em "stand by" para salvar a nação.
Por mais que algumas ditaduras aumentem a taxa de desenvolvimento de um país, o saldo político é sempre negativo. O regime militar implantado no Brasil perseguiu, durante anos, o metalúrgico Lula, que hoje é presidente da República. No Chile, a atual presidente foi presa e torturada pelos esbirros de Pinochet e teve o pai assassinado durante o seu regime.
Apesar disso, há parcelas da opinião pública, tanto no Chile como no Brasil, que cultivam a nostalgia dos tempos de chumbo, achando que os governos tudo podem e que o povo, não sabendo votar, merece um déspota, que não precisa ser necessariamente esclarecido.
Basta ser ditador, governar com mão forte e não dar bola para o repúdio da nação.


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