São Paulo, Quarta-feira, 13 de Janeiro de 1999
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A importância das Bolsas

ANTONIO DELFIM NETTO

Desde meados dos anos 20 os economistas têm discutido -sem chegar a uma conclusão- sobre o que deve ser feito com a política monetária em circunstâncias como as atuais, em que o ritmo dos preços dos bens e serviços e do nível de produção da economia está caindo e o mercado de ações revela um extremo vigor. A maioria dos economistas se inclina a reservar a política monetária para obter a estabilização do nível geral de preços, sem se preocupar com o mercado acionário. Estamos diante do velho dilema de que não é possível atingir dois objetivos (manter o nível de preços dos bens e serviços e evitar a especulação acionária) com um único instrumento, a taxa de juro de curto prazo.
Nos anos que antecederam a crise de 1929, o então presidente do Fed insistia que a política monetária deveria "promover a estabilidade dos preços, a manutenção de alto nível de atividade econômica e a prevenção de "excessiva" especulação, especialmente no mercado acionário". Ele percebia claramente que a redução da taxa de juros (para corrigir a dramática baixa dos preços que estava acontecendo) poderia acelerar ainda mais a "especulação instalada no mercado acionário". Setenta anos depois, outro presidente do Fed caracterizou não de "excessivo", mas de "exuberante" o crescimento dos preços das ações e encontrou-se com o mesmo dilema: um aumento da taxa de juros poderia interromper sete anos de crescimento vigoroso da economia americana com taxa de inflação e desemprego declinantes. Em outras palavras, se usasse a taxa de juros de curto prazo para interromper a "exuberância" do mercado acionário, corria o risco de arruinar a economia real.
O mercado acionário assumiu tal importância na valorização do estoque da riqueza dos americanos que uma inversão brusca e profunda de sua tendência pode dar lugar a um movimento de graves consequências sobre a economia real. Em primeiro lugar há uma dúvida razoável sobre se existe ou não uma "bolha" no mercado americano, uma vez que, dependendo das circunstâncias, os preços dos bens e serviços e o de um ativo como as ações podem mover-se em direções diferentes pelo menos durante algum tempo. Uma redução persistente e entendida como permanente da taxa de inflação (e, consequentemente, da sua volatilidade) pode sugerir uma queda futura da taxa de juro real de longo prazo e, ao mesmo tempo, a continuação do crescimento econômico, o que tenderia a elevar os preços das ações.
Em segundo lugar, dada a importância do valor acionário na riqueza dos agentes econômicos, a sua redução pode pôr em marcha um processo recessivo importante. De um lado, o alto preço das ações reduz o custo de capital para as empresas e, portanto, estimula o investimento. De outro, ele é percebido como um aumento da renda permanente e estimula o consumo. Alguns estudos empíricos têm confirmado o efeito das flutuações do mercado acionário sobre o nível do consumo. Um recente trabalho da OCDE (dezembro de 1998) no G-7 (e mais particularmente nos EUA) mostra claramente esse efeito. O mais surpreendente é que ele sugere que uma "queda de 20% no mercado acionário do G-7 deve reduzir, em dois anos, em 0,75% a taxa de crescimento do PIB da OCDE". Não foi à toa nem só para ajudar os "emergentes" que os bancos centrais reduziram a taxa de juros...


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras, nesta coluna.



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