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O dólar e o PIB
Polêmica sobre impacto de importações na economia precisa levar em conta capacidade ociosa da indústria local
INSTAUROU-SE um debate interessante acerca dos efeitos
do câmbio valorizado no
Produto Interno Bruto. A
polêmica recai sobre os números
do ano passado, mas seu foco está voltado para o tipo de resposta
que a política econômica deve
oferecer a esse fenômeno hoje.
Está em questão o diagnóstico
de que as importações, favorecidas pela baixa cotação do dólar,
funcionaram como um freio à
atividade doméstica. Um grupo
de economistas acredita que as
compras de fornecedores estrangeiros, pelo contrário, beneficiaram a economia brasileira. Elas
deram esteio, argumentam, ao
crescimento do consumo sem
pressões inflacionárias.
Desde logo suprimam-se os argumentos contábeis da discussão. Por convenção, as importações sempre entram com sinal
negativo no cálculo do PIB. Do
mesmo modo o produto interno,
pela ótica da demanda, será sempre a soma de quatro contas estanques (o consumo das famílias,
o do governo, as despesas com
investimentos e o saldo comercial). Quando a fatia de uma dessas contas se expande, a correspondente às outras três necessariamente diminui.
Por mera lógica contábil, o saldo comercial, por exemplo, vem
diminuindo de tamanho no PIB
brasileiro, enquanto o consumo
das famílias vem aumentando. A
questão relevante, no entanto,
não é saber como estão se dividindo as partes do bolo. É indagar se o próprio bolo (a quantidade bruta de bens e serviços produzidos no Brasil) poderia ter
crescido mais sob outro arranjo
macroeconômico.
Os que questionam a hipótese
do desvio do PIB para o exterior,
portanto, deveriam buscar provas de que as importações suprem a parte da demanda doméstica a que a indústria local
não tem condições de atender.
Precisariam mostrar que os setores fabris que mais sofrem concorrência estrangeira estão com
capacidade produtiva esgotada,
impedidos de ampliar a oferta de
suas mercadorias. Nesse caso, as
importações terão sido benéficas
para o PIB, permitindo expansão
maior do consumo sem inflação.
Há evidências, no entanto, de
que as importações crescem nos
setores em que a indústria instalada no Brasil se retrai. A capacidade ociosa das fábricas locais
nesses segmentos aumenta -poderiam, portanto, ampliar a oferta de seus produtos rapidamente
caso houvesse demanda.
A produção de calçados e artigos de couro, por exemplo, amargou quedas de 3,2% em 2005 e
2,7% em 2006. A importação
desses itens aumentou 11,7% no
ano passado. No setor de vestuário, contra retração na produção
local de 5% em 2005 e 5% em
2006, houve aumento de importações de 24% em 2006.
Os dados do IBGE acerca da
variação do PIB no ano passado,
a serem divulgados no dia 28, vão
subsidiar a polêmica com mais e
melhores estatísticas. Dificilmente, no entanto, vão alterar a
convicção de que o câmbio valorizado favoreceu a troca de fornecedores locais por estrangeiros -e, assim, contribuiu para
uma expansão da economia em
2006 menor do que se a cotação
do dólar estivesse mais alta.
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