São Paulo, quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

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Alimento na balança

Com preço da comida em elevação no mundo, agronegócio ajuda a manter perspectivas de crescimento do Brasil

A SEGUNDA crise do petróleo, no final da década de 1970, e a alta dos juros internacionais ocorrida na seqüência arrastaram a economia dos países em desenvolvimento para a recessão. Como regra, grandes exportadores de petróleo (caso dos árabes), minério (Chile) e produtos industrializados (Coréia do Sul) conseguiram superar mais rapidamente as dificuldades.
Mais de um quarto de século depois, novo surto no preço de mercadorias básicas, num contexto de resfriamento da economia americana, ameaça o crescimento mundial. Desta feita, contudo, além do petróleo, a inflação ocorre também nos alimentos. A chegada de centenas de milhões de pessoas ao mercado consumidor, principalmente na China e na Índia, mantém bastante aquecida a procura por comida.
Nesse cenário, estão mais suscetíveis a pressões inflacionárias que ameaçam o crescimento os países pobres -onde a população usa grande parcela da renda para comprar comida- e importadores de alimentos. O Brasil, nação de renda média mas concentrada, possui certa vulnerabilidade no primeiro quesito, mas dispõe de um trunfo no segundo: é um dos maiores exportadores de alimentos do planeta.
O agronegócio brasileiro vendeu a clientes estrangeiros US$ 58,4 bilhões em mercadorias no ano passado. O valor corresponde a mais de um terço de tudo o que o Brasil exportou em 2007. No balanço anual das transações do agronegócio, o país obteve superávit de quase R$ 50 bilhões -maior, portanto, que o saldo de R$ 40 bilhões obtido na balança de todo o comércio no período.
Tal desempenho dos produtores de alimento no comércio externo, potencializado pela alta no preço dessas commodities, foi um dos lastros a permitir o salto de 32% nas importações de bens e serviços no ano passado. As compras do exterior, por sua vez, deram fôlego para o aumento do consumo dos brasileiros, assim como para a aquisição de máquinas pelas empresas, fatores que capitanearam a forte expansão do PIB em 2007.
A capacidade de importar mais ajudou a mitigar o efeito final, nos índices de inflação, da alta dos alimentos. Na cidade de São Paulo, apesar de a comida ter encarecido 12,7%, a inflação média ao consumidor em 2007 não passou de 4,4%, segundo a Fipe.
É um dado alentador, portanto, a projeção feita ontem pelo IBGE de que o Brasil vai colher em 2008 mais uma safra recorde -136,5 milhões de toneladas, volume 2,7% superior ao de 2007, que já havia sido o maior da história. Constitui mais um indicador de que o Brasil pode continuar crescendo a taxas razoáveis, baseado na expansão do consumo e do investimento, mesmo num contexto de baixo dinamismo no mundo rico.
O grande complicador, no médio prazo, continua sendo a cotação do real diante do dólar -valorizada, em parte, por conta da própria expansão do faturamento externo do agronegócio. O dilema, que torna o controle da inflação mais oneroso para a competitividade do setor industrial, segue sem solução por parte da política econômica e pode cobrar um preço elevado no futuro.


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