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MELCHIADES FILHO
Saque por baixo
BRASÍLIA - Aos poucos, os "spinners" do Planalto consolidaram
três lendas urbanas sobre o uso
abusivo e irregular de cartões corporativos pelo governo federal.
A primeira é a de que o presidente
merece aplausos por abrir as contas
pela internet. Um baita exagero,
posto que 90% dos gastos do ano
passado não foram divulgados pela
Controladoria Geral da União. De 0
a 10, portanto, Lula merece nota 1
em transparência -pouco, a rigor,
para cantar vantagem sobre o governo Serra, que, como o de outros
Estados, zerou nesse quesito.
A segunda é a de que não há nada
a fazer quanto à fatia mais polpuda
de despesas: as retiradas em contas
do tipo B e na boca do caixa com os
cartões (R$ 158 milhões, em 2007).
Surpreendido pelas denúncias
nas compras a crédito com os cartões, o governo anunciou a extinção
das contas B (só em junho) e fixou
novo teto para saques. Mas nada falou sobre os gastos passados nem
sobre intensificar a fiscalização.
As prestações de conta da movimentação em dinheiro vivo estão
(ou deveriam estar) mofando nos
ministérios. Cabe ao Planalto requisitá-las para apurar se há notas
frias e indícios de salário indireto.
(O mesmo vale para o TCU, que
por enquanto só executou varredura meia-boca nessas despesas.)
Quanto ao futuro, o Planalto deveria se comprometer a tornar públicos também os detalhes do uso
da boca do caixa, divulgando no
Portal da Transparência a razão dos
saques e os dados (nome e CNPJ)
dos fornecedores contemplados.
A terceira lenda urbana é a de que
o caso é irrelevante -ou tem a relevância de uma tapioca. O escândalo
dos cartões trata de miudezas também, mas pode ter um efeito graúdo
sobre o controle dos gastos públicos. Se há um viés político, paciência. O governo não pode usá-lo como desculpa para a inação. Deixar
sem vigilância os saques em dinheiro significa oferecer um salvo-conduto para quem fraudou -e para
quem vai fraudar.
mfilho@folhasp.com.br
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