São Paulo, quinta-feira, 13 de maio de 2004

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UM ERRO

Foi um grande erro a decisão do governo brasileiro de expulsar do país o jornalista Larry Rohter, do jornal norte-americano "The New York Times", autor de reportagem segundo a qual o presidente Luiz Inácio Lula da Silva abusaria do consumo de bebidas alcoólicas.
Antes de mais nada, trata-se de uma medida truculenta que, em preocupante senda obscurantista, arranha o essencial instituto da liberdade de expressão. A partir de agora correspondentes estrangeiros terão de se preocupar se os textos que escrevem irão ou não agradar ao Planalto. Na hipótese de deixarem as autoridades descontentes, o risco é a expulsão. E, como escaladas de arbítrio muitas vezes começam com episódios aparentemente pequenos, também jornalistas brasileiros poderão sentir-se ameaçados. Fica a sensação de que o governo se deixou levar por uma inclinação autoritária.
Mesmo considerando apenas o ponto de vista do Planalto, a cassação do visto do jornalista é um exagero e revela o amadorismo e a inabilidade do núcleo de auxiliares que cerca Lula. Com efeito, o presidente vinha saindo-se bem no caso. A qualidade técnica da reportagem era no mínimo discutível. Nada autorizava o correspondente a afirmar que a relação do presidente da República com bebidas se transformara em "preocupação nacional". Suas considerações basearam-se em rumores e em fontes suspeitas. Esta Folha noticiou e reproduziu a reportagem no domingo por entender que se tratava de um fato jornalisticamente relevante. O diário nova-iorquino é um dos mais influentes do mundo.
As deficiências e o tom injurioso do material publicado fizeram com que vozes representativas dos mais variados setores da sociedade brasileira saíssem em defesa do presidente. Certamente que Lula tem todo o direito de se sentir agredido e de exigir reparação. Ao decidir, porém, pela expulsão, o Planalto deu ao episódio uma dimensão que ele não tinha nem merecia ter. Provincianamente, transformou o caso em questão de Estado e feriu liberdades públicas. Se o governo receava que a reportagem fosse provocar danos à imagem do país, agora pode ter certeza de que essa expulsão o fará.


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