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VALDO CRUZ
O milagre virá?
BRASÍLIA - Bento 16 encerra hoje
sua visita ao Brasil. Sua passagem
seguiu um figurino já previsto, sem
surpresas, o que não deixa de ser
frustrante. Sua pregação poderia
ter tido um sentido mais social, não
necessariamente dissociado da espiritualidade cristã.
Óbvio que seria irrealista imaginá-lo perfilado com representantes
da igreja progressista. Não se trata
disso. Mas ele poderia ter dado à
questão social um maior destaque
em seus discursos.
Seu enfoque, porém, ficou praticamente centrado no código moral
da Igreja Católica: contra o aborto,
contra a camisinha, em defesa da
castidade. Nos bastidores, preocupou-se mais com as negociações entre igreja e Estado.
Demais temas ganharam contornos secundários. Chegou a destacar
o "déficit histórico de desenvolvimento social" do país na fala aos
bispos brasileiros. Antes, porém,
lembrou que os sacramentos da
igreja devem preceder sua ação social. Uma forma de enquadrá-los,
de mantê-los em rédea curta.
Sua Santidade, contudo, bem que
poderia surpreender em seu último
dia de viagem, quando abre a Conferência Episcopal Latino-americana. Ali, o tema teologia da libertação, tão condenado por ele no passado, pode aflorar.
Campo fértil há. Desde que o Vaticano sufocou essa corrente do catolicismo, no início dos anos 80, a
desigualdade social na América Latina só cresceu. E, mesmo reprimida, a doutrina manteve-se ativa,
pregando uma igreja a serviço da
transformação social.
Há quem acredite num milagre e
espere uma mensagem do papa na
abertura do encontro de apoio ao
trabalho das comunidades eclesiais
de base, que ainda resistem, principalmente nas periferias e interior
do país.
Como milagre é coisa rara hoje
em dia, melhor apostar nos adeptos
da teologia da libertação presentes
à reunião episcopal. Eles ainda existem, apesar dos papas.
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