São Paulo, quarta-feira, 13 de junho de 2001

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ANTONIO DELFIM NETTO

Dificuldades do Banco Central

É opinião generalizada entre os que se interessam pela evolução da economia que a qualidade do trabalho do Banco Central tem melhorado muito desde que o país foi levado, em 1999, ao desastre cambial. De um lado, continuou a imposição (talvez até com velocidade exagerada) da legislação prudencial que vai desembocar no novo sistema de pagamentos.
De outro, a introdução de um sistema de metas inflacionárias, acompanhada de uma política de liberdade cambial, mostrou-se eficaz, pelo menos até o momento. Todos sabem que, em condições normais de pressão e temperatura, com uma política fiscal que mantém relativamente constante a relação entre a dívida líquida e o PIB, com estímulo suficiente às privatizações e estímulo para os investimentos diretos externos (para cobrir boa parte do déficit em conta corrente), o sistema funciona. Nessa situação, o Banco Central acaba criando "expectativas" de inflação aceitáveis. Através delas, coordena-se a formação dos salários nominais e, consequentemente, a formação dos preços, transformando a "expectativa" numa realidade. Isso, por sua vez, reforça a credibilidade da política do Banco Central, que dispõe de um único instrumento (a taxa de juro nominal de curto prazo) para atender a um único objetivo (a meta inflacionária). A rigor, a taxa de câmbio não é problema do Banco Central.
É preciso, portanto, aceitar o fato de que, no sistema de câmbio flutuante, ele flutua. Quando as condições mencionadas anteriormente estão presentes, mas: 1) o país é contagiado por efeitos externos (Argentina e Turquia); 2) há modificação nas condições de crescimento dos seus parceiros (redução do crescimento americano, do europeu e do japonês) e 3) é simultaneamente atingido por choques de oferta internos (oferta de curto prazo de alimentos e racionamento de energia elétrica) ou por movimentos da moeda universal (o dólar), as flutuações do câmbio podem não ser apenas "ruídos" em torno da taxa de câmbio de equilíbrio.
A administração da economia fica muito mais difícil quando ocorrem choques de oferta. As dificuldades hoje enfrentadas pelo Banco Central são visíveis e exigem algum aperfeiçoamento do sistema de metas inflacionárias, como temos insistido nesta coluna. Felizmente, parece que a recente conferência sobre o problema, coordenada pelo Banco Central, mostrou que ele está sensível a eliminar as metas "gregorianas" e a pensar em utilizar abertamente alguma forma de "núcleo" da inflação.
Isso ajudará na formulação da política monetária, mas não eliminará as dificuldades de lidar com os choques de oferta. A última coisa que o Banco Central deve fazer é alterar a meta inflacionária, pois isso seria o fim da sua já abalada credibilidade. Agora, é manter a meta dos 4% e procurar atingi-la num prazo de 12 a 18 meses, sem precipitar a redução de atividade e de emprego mais do que o necessário.


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.


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