São Paulo, domingo, 13 de junho de 2004

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TENSÃO NA VENEZUELA

A realização do plebiscito para decidir se o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, deve ou não deixar o cargo antes do final de seu mandato representa um passo importante para a preservação do processo democrático. Mas não se deve nutrir a ilusão de que a consulta popular bastará para arrefecer a tensão política no país vizinho.
Afora as previsíveis contestações de resultados, a oposição seguirá em seus esforços para depor o presidente caso ele saia vitorioso. Se, ao contrário, vencerem os oponentes, terá início uma nova batalha político-judicial para definir se o próprio Chávez poderá participar da eleição que escolherá seu sucessor.
O tema é polêmico, já que se trata de eleger um substituto para terminar o mandato, e não de renová-lo com a convocação de eleições presidenciais. Em princípio, deposto pelo plebiscito, não faria sentido Chávez se recandidatar. Ou será que diante das candidaturas que se apresentarem o eleitorado teria o direito de recuar e reconduzir o presidente ao cargo? A controvérsia deverá chegar ao Supremo Tribunal de Justiça, que dará o parecer final.
Existem ainda outras incógnitas. A oposição, caso consiga seu intento no referendo, vai se dividir ou terá candidato único no pleito? Se ela se apresentar dividida, cresce a probabilidade de vitória do próprio Chávez ou do candidato que o representará. O plebiscito está previsto para o dia 15 de agosto. Se, por alguma razão ou manobra política, ele for adiado para depois do dia 19, data que marca a metade do mandato, uma eventual derrota do presidente não implicará a realização de nova eleição: o vice-presidente José Vicente Rangel, até aqui um aliado fiel de Chávez, assumiria a Presidência. Nessa hipótese, o agravamento da instabilidade política na Venezuela é considerável.
Outra alternativa é o plebiscito deixar a situação indefinida. Isso ocorreria se os adversários conseguissem a maioria dos votos válidos contra Chávez, mas não na proporção necessária para removê-lo (mais do que 3,76 milhões de votos, que foi o total obtido pelo presidente na eleição de 2000). Nesse caso, a oposição se sentiria fortalecida, mas Chávez não teria a obrigação legal de deixar o cargo. Mais uma vez se desenharia um quadro delicado, no qual golpistas poderiam se sentir tentados a agir.
A situação na Venezuela é tensa o bastante para, no pior cenário, converter-se numa guerra civil. Nesse contexto, são ainda mais graves as notícias de que chavistas pretenderiam limitar a presença de observadores internacionais no plebiscito. Essa ameaça já justificaria que o Brasil movesse esforços diplomáticos no sentido de oferecer ao país vizinho apoio para a realização de um pleito cuja lisura pudesse ser atestada pela comunidade internacional. Para isso, no entanto, o governo brasileiro teria de demonstrar firme eqüidistância, o que pode ser dificultado pela percepção de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se alinha entre os admiradores de Chávez.



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