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RUY CASTRO
Brinde ao sofisma
RIO DE JANEIRO - No mundo
encantado dos comerciais vigiados
pelo Conar (Conselho de Auto-Regulamentação Publicitária), beber
cerveja é uma das grandes experiências ao alcance do homem. É a
garantia de uma eterna "joie de vivre", de viver cercado de amigos
(mas apenas dos que tomam a mesma marca) e de ter acesso a mulheres fabulosas em praias idem, mesmo que de estúdio.
Segundo a auto-regulamentação
cometida, digo, praticada pelo Conar, beber cerveja é pouco mais do
que beber Crush ou Grapette. Ou
seja, não é "álcool". O fato de médicos e psiquiatras garantirem que
duas latas de 350 mililitros de cerveja equivalem em conteúdo alcoólico a uma dose padrão de 50 mililitros de vodca ou uísque não comove
os auto-regulamentadores. Um publicitário paulista já decretou que
"não tem nada a ver".
O Conar, para mostrar que se
preocupa com a saúde da população, afirma que, nos anúncios de
cerveja, de algum tempo para cá, os
modelos têm de "aparentar mais de
25 anos" e "foram banidos os bonecos e bichinhos, elementos do universo infantil". Quer dizer que, até o
Conar entrar no caso, o que levou
anos, milhões de crianças brasileiras ficaram expostas de propósito a
essa propaganda subliminar?
A proposta da Anvisa (Agência
Nacional de Vigilância Sanitária) de
tirar do ar os comerciais de cerveja
entre 8h e 20h é tímida. Deveria se
estender até às 24h. Mesmo assim,
tem contra si as cervejeiras, as
agências de propaganda, as TVs, o
Zeca Pagodinho, os desinformados
sobre alcoolismo e o Conar. Este último, em nome de um sofisma em
legalês, acusa a medida de inconstitucional e diz que o fórum para resolver o caso é o Congresso.
Onde os brindes (com champanhe) já estão sendo preparados, no
caso de vitória dos barões da cerveja sobre a responsabilidade social.
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