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Um só futuro ou voltar ao passado
LUIZ PAULO VELLOZO LUCAS e ARNALDO JARDIM
As recentes descobertas não foram ato divino nem fruto exclusivo do trabalho da Petrobras. Têm relação com a Lei do Petróleo
EM ARTIGO publicado nesta Folha no último dia 31 de maio
("Diferentes futuros", Dinheiro, pág. B2), o economista César Benjamin, do PSOL, defende que "a sociedade brasileira reabra a discussão sobre sua política para o petróleo", por
duas razões: pelo salto de dez vezes no
preço internacional e pelas recentes
descobertas de petróleo.
Em seguida, o artigo nos chama a
decidir uma suposta opção entre um
modelo do tipo adotado pela Noruega, virtuoso, e um outro modelo praticado pelo México, que, afirma o autor,
torrou suas reservas em poucos anos,
permanecendo pobre e periférico.
Quanto à primeira situação, referente à alta dos preços, trata-se, realmente, de um fato de alto impacto,
devido a uma combinação do crescimento da demanda (com a entrada da
China e da Índia no mercado global)
com um forte aquecimento da especulação no mercado de futuros. Constata-se, portanto, que houve uma mudança na realidade internacional.
No que se refere ao segundo fato, as
recentes descobertas não foram nem
ato divino, nem fruto exclusivo do
trabalho de 50 anos da Petrobras, como quer o articulista.
O espetacular crescimento das reservas, da produção de óleo e gás, da
participação do setor de petróleo no
PIB (que subiu de 2% em 1997 para
mais de 10% hoje), do número de empresas atuando no país -atualmente,
são 71 empresas, das quais 36 nacionais-, enfim, tudo isso se deve, fundamentalmente, à mudança na política para o setor feita dez anos atrás,
com a abertura do setor ao investimento privado, nacional e estrangeiro e a criação da ANP (Agência Nacional do Petróleo), que passou a ser a
responsável pela gestão do monopólio da União.
Só a má-fé, ou a desinformação, ou
ainda uma combinação de ambas é
capaz de sonegar a relação de causação entre a mudança do modelo realizada pela Lei do Petróleo há dez anos
com as recentes descobertas. A legislação atual, "feita no auge do encantamento neoliberal", como disse Benjamin, é a grande culpada pela nova realidade pós-descobertas. Ou seja, por
culpa do seu sucesso, ele reclama sua
revisão.
A revisão, a rigor, foi feita em 1997,
abrindo o setor, que era de uma só
empresa -a Petrobras-, ao investimento privado com regulação pública. Hoje, o setor do petróleo no Brasil
é do tamanho de uma Petrobras 100%
maior, somada a mais outras 70 empresas. Mudar a lei é fazer a revisão da
revisão, que vem a ser, na verdade, a
volta ao modelo que existia antes da
Lei do Petróleo.
Mudar a lei quer dizer acabar com a
licitação pública internacional como
modelo de organização do setor de
exploração e produção.
Significa também abandonar o conceito de mercado regulado, voltando a
Petrobras a ser a representante operacional exclusiva do monopólio da
União, fazendo "contratos de partilha" com empresas privadas, de acordo com sua conveniência, sem passar
por licitação. Por analogia, equivale a
trocar contratação por meio de concurso público por nomeação de cargos comissionados escolhidos pelo
governante de plantão.
O governo pode aumentar as receitas do Estado, aumentando as participações governamentais, em particular, as participações especiais que se
aplicam sobre a rentabilidade das empresas, sem mudar o modelo de concessão através de licitações.
Pode também não torrar o dinheiro
e guardá-lo ou investi-lo nas gerações
futuras, como faz a Noruega.
O México, certamente, não é modelo para ninguém, muito menos para o
Brasil, que se inspirou exatamente no
capitalismo social-democrata da Noruega para modernizar sua legislação
em 1997.
LUIZ PAULO VELLOZO LUCAS, engenheiro, é deputado
federal pelo PSDB-ES e presidente do ITV (Instituto Teotônio Vilela). Foi prefeito de Vitória (ES) de 1996 a 2004.
ARNALDO JARDIM, engenheiro civil, é deputado federal
pelo PPS-SP.
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