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REPÚBLICA RENTISTA
A abertura financeira e comercial promovida no Brasil
no início dos anos 90 permitiu a estabilização monetária, mas a expressiva valorização da taxa de câmbio e as
elevadas taxas de juros domésticas
ampliaram o endividamento público
externo e interno. No início do Plano
Real, a situação financeira do setor
público brasileiro era relativamente
confortável. O governo anterior havia realizado um ajuste fiscal de grandes proporções. Em 1994, a dívida líqüida do setor público -governo federal, Banco Central, governos estaduais, municipais e estatais- era de
28% do PIB, mas cresceu continuamente para 58,7% do PIB em 2003.
Inicialmente, a expansão da dívida
pública foi fruto da necessidade de
captar recursos estrangeiros para financiar os déficits em transações
correntes e acumular reservas internacionais -por meio de captações
no exterior e não de saldos comerciais- que eram "esterilizadas" mediante a emissão de títulos. Em seguida, a dívida floresceu com os juros exorbitantes praticados para defender a taxa de câmbio sujeita a crises recorrentes. Foram esses fatores
que alimentaram a dívida pública e
não os gastos excessivos do governo.
A rolagem dos títulos da dívida, oferecendo elevada liqüidez e taxas de
juros reais acima de 10% ao ano, travou o investimento produtivo. O resultado foi uma taxa de crescimento
média de 2,2% em dez anos, com
elevado patamar de desemprego, demanda interna reprimida e reduzida
oferta de crédito.
Nesse contexto, a rentabilidade da
produção perdeu para a do setor financeiro, como mostrou reportagem desta Folha no domingo. Entre
1995 e 2003, o retorno médio anual
dos fundos DI, uma aplicação financeira relativamente conservadora, alcançou 18,3% (já descontada a alíquota de 20% do IR); a rentabilidade
média das empresas de capital aberto não-financeiras foi de apenas
3,6% no mesmo período.
Essa realidade evidencia que a economia brasileira é presa de uma armadilha que tem tolhido sua capacidade de investimento e crescimento.
É como se o país estivesse se transformando numa sociedade de rentistas, com a riqueza dirigida para fundos de investimento lastreados em títulos da dívida pública, de baixo risco e alto rendimento. De certa forma,
os agentes econômicos, empresas,
bancos, classes médias, tornaram-se
sócios compulsórios de uma realidade na qual a produção, relegada ao
segundo plano, deu lugar a uma ciranda financeira.
Esse círculo vicioso exige ajuste fiscal permanente e cada vez maior para
pagar os juros da dívida pública e absorver os impactos das flutuações
cambiais. O pagamento de juros
atingiu US$ 145,2 bilhões em 2003, o
equivalente a 9,6% do PIB. O país
precisa, portanto, encontrar uma
saída para a armadilha de juros altos,
estrangulamento fiscal e baixo crescimento. É indispensável enfrentar o
desafio da irresistível atração do sistema financeiro para os títulos da dívida pública. Para isso, é necessário
estimular a tomada de posições de
longo prazo para suportar novos investimentos privados de alto retorno
em exportação e em infra-estrutura,
libertando-os dos limites do orçamento fiscal. A redução dos juros
reais e a expansão do crédito são
condições para elevar os investimentos e as taxas de crescimento.
Torna-se relevante também reduzir
a tributação sobre o investimento
produtivo. Enquanto o setor produtivo pode estar sujeito a 61 tributos,
uma aplicação financeira de 30 dias
está a apenas seis. Investimentos
produtivos e as aplicações financeiras de longo prazo necessitam receber tratamento fiscal diferenciado.
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