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JOSÉ SARNEY
Uma baleia
na eleição
O Rio de Janeiro já foi um porto
pescador de baleias. Elas entravam na baía de Guanabara e ali ficavam bailando, como área de alimentação e de criação. Os homens as espantaram na matança secular a que a espécie foi submetida.
Frei Vicente do Salvador afirma que,
em 1602, foi iniciada a pesca sistemática, que passou a ser uma das rendas de
grande significação da metrópole. Depois, a pesca foi -como a Petrobras
até bem pouco tempo- monopólio
do Reino, com contratos terceirizados, flexibilizados (linguagem atual),
para a exploração que ia do Desterro
(Florianópolis), passando pelo Rio e
por Angra dos Reis, até a Bahia. Mataram tanto que elas desapareceram,
mudaram seu caminho de procriação
e, hoje, quase todas as espécies precisam de tratados e de convenções internacionais para sobreviver.
A baleia sempre foi uma fascinação
na imaginação do homem. Quem não
se lembra de Moby Dick, a baleia
branca, aquela que comeu a perna do
capitão Ahab, que, depois, perseguido
pela idéia de vingança, procurou por
ela nos sete mares e, afinal, ao encontrá-la e arpoá-la, a corda enrolou-se
em seu pescoço e, com Moby Dick, foi
para os abismos das águas, onde as
baleias cantam seus sons de acasalamento.
Herman Melville, ele mesmo caçador de baleia, deu-nos essas páginas
magistrais, que não morrem nunca.
A baleia que aportou no Rio é dos
tempos passados, lembrando o caminho de seus ancestrais. O que há de
novo é que, em vez de arpoá-las, hoje
chora-se por elas. Aquele menino, nos
braços de sua mãe, a derramar lágrimas pela agonia da baleia, é uma prova de que o mundo melhorou.
Quando presidente da República,
em 1987, proibi a caça da baleia, o que
me custou muitas pressões, principalmente porque se alegava que a indústria era a única fonte de renda de pequeno município da Paraíba. Depois
de alguns anos, as baleias voltaram às
costas do Brasil. Não temos mais Pedro de Urecha, aquele que veio ao Brasil no século 17 ensinar a matar baleias.
Mas, em compensação, se não matamos mais baleias, na insegurança das
nossas cidades, como o Rio, são os homens que são mortos, vítimas do crime organizado, do narcotráfico e da
violência humana.
Carlos Lacerda, esse admirável homem público, que até hoje faz falta ao
Brasil, em determinado momento de
crise política, em que as coisas não estavam claras, resolveu escrever sobre a
Sociedade Protetora dos Animais. Nada melhor que, quando os homens
não se entendem, lembremos os animais, que se entendem melhor que os
homens, principalmente as baleias,
que, vivendo muitos anos (até 200)
podem aprender a corrigir seus caminhos e fugir dos predadores.
O que tem a baleia com a política?
Não encontro uma relação clara, a não
ser a mais evidente, que a baleia não
vota e não é votada. Certamente, a que
chegou ao Rio não foi por causa da
eleição acirrada que aí se desenrola,
mas para morrer na praia, agonizante
e de fadiga, como neste tempo eleitoral morrem muitos candidatos.
As lágrimas do menino da baleia
mostram que a humanidade é bem
melhor do que muitas vezes nós pensamos.
José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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