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CLÓVIS ROSSI
Aritmética e racismo
SÃO PAULO - OK, a Bolívia está
dividida entre o presidente Evo
Morales e um punhado de governadores provinciais. Mas vamos fazer
direitinho a aritmética dessa divisão: dois terços dos bolivianos estão
com o presidente, e o terço restante, com a oposição.
Jogar na aritmética o forte apoio
dado ao governador oposicionista
de Santa Cruz de la Sierra, Rubén
Costas, é distorcer as contas. Costas
só foi votado em sua terra; Evo, em
toda a Bolívia.
É claro que ambos estão legitimados, como sempre acontece com os
ganhadores de consultas eleitorais
na democracia. Mas é justo dizer
que Evo Morales está mais legitimado do que qualquer dos outros
ganhadores. Afinal, o presidente
obteve cerca de dez pontos percentuais a mais do que na eleição presidencial de 2005. Única leitura possível, de resto óbvia: há
mais bolivianos que aprovam Evo
hoje do que os que nele votaram em
2005, apesar de todo o alto grau de
conflitividade em seus dois anos e
meio de gestão.
Evo ganha o direito de passar o
rolo compressor na oposição, como
o fez, por exemplo, aprovando em
um quartel -e só com sua turma-
o texto constitucional? Não, mesmo que ele pudesse fazê-lo, o que
não parece ser o caso.
Mas lhe dá o direito de cobrar da
oposição o comportamento democrático que ela reclama de Evo.
Chamar o presidente de "macaco", como o fez Rubén Costas, é tudo, menos democrático. Revela uma
divergência que é não só sobre autonomias nem só ideológica mas também étnica -ou racismo em estado
puro.
O fato é que a maioria dos bolivianos cabe no rótulo de "macaco"
quando vistos por Costas. E maioria
ganha eleição.
À oposição resta conviver com essa matemática ou partir para a separação, perdendo no percurso o
direito de acusar o presidente de ter
o monopólio do radicalismo.
crossi@uol.com.br
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