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Sexta-feira 13
JOSÉ SARNEY
Não tenho superstições, sou o próprio supersticioso. Vivo a descobrir
eflúvios secretos de cores, coisas, pessoas, objetos. Mas excluí o 13, agosto e
sexta-feira de influências negativas.
Sexta-feira é até um dia simpático.
Este ano tem suas encantarias e desperta prudência: de saída três noves,
1999. É véspera de 2000, fim de século,
ano que tem a curiosidade de um fevereiro de 29 dias, o que só ocorre, em virada de século, de 400 em 400 anos. É a
segunda vez, depois do calendário
gregoriano de 1582.
Compõe o cenário a invenção de um
apocalipse, que coincidiria com o
eclipse total do Sol, dia 11, acabando o
mundo na quarta-feira, como o Carnaval.
Paul Valéry, citado por Jay Gould
nas suas "Conversas sobre o Fim do
Mundo", diz que o "destino de toda
espécie é acabar. A sobrevivência é a
exceção". O homem é muito jovem na
história da Terra, que tem 4,5 bilhões
de anos. Nossa espécie, somente 200
mil anos! Mesmo jovens, contraímos a
mania de que nosso fim está próximo.
Dizem que a culpa é da Bíblia com a
ameaça do fim dos tempos.
O mundo já acabou algumas vezes e
em outras escapou ileso. Dizem os fósseis que no Período Permiano, há 250
milhões de anos, 95% das espécies desapareceram. Entre o Cretáceo e a Era
Terciária caiu um objeto extraterrestre gigantesco e, no impacto, levou os
dinossauros, aqueles bichinhos frágeis, grandes, de cabeça pequena.
O arcebispo Ussher, da Irlanda, no
século 17, fez uma cronologia baseada
em estudos sagrados e descobriu que
o mundo foi criado em 23 de outubro,
ao meio-dia, no ano 4004 antes de
Cristo, e que iria acabar em 23 de outubro de 1997, também ao meio-dia. Já
quando veio o primeiro milênio, surgiu o pânico de que o fim seria em
1033, mil anos depois da ressurreição
de Jesus. O religioso Müntzer anunciou que acabaria em 1525. O adventista Miller deu a data de 1840, e o criador das Testemunhas de Jeová, a de
1914. Sem televisão nem Internet, nossos antepassados, ignorantes de muita
coisa, sofreram as angústias e o medo
desses anúncios.
Eu posso calcular um pouco. Menino, 1936, em São Bento, cidade que
tanto estimo e ligada indelevelmente à
minha infância, anunciaram o fim do
mundo, com a prudência de dizer que
antes o sinal era a vinda do diabo. Ele
chegaria anunciando o fim dos tempos, e, para contê-lo, o remédio era colocar uma cruz na parte posterior da
porta de entrada das casas. Meu avô,
prudente, providenciou logo o antídoto, pintado de preto. Ficamos protegidos. Quantas noites (como guardei na
memória) pensava que o diabo estava
chegando, e com ele o fim do mundo.
Ladainhas, procissões, exorcismos
mobilizaram aquele povo de fé e, graças a esse fervor, a Terra não acabou
naquele tempo, serviço prestado pelo
Maranhão ao mundo!
Sobreviventes de tantos apocalipses,
saudemos a ressurreição de todos nós,
resistentes a tudo: gato preto, jacaré
empalhado, pinguim de geladeira, os
tubs, o goleiro do México, Monica Lewinsky, o Beijoqueiro, mesmo sendo
sexta-feira 13, mês de agosto.
José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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