São Paulo, quarta-feira, 13 de setembro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ANTONIO DELFIM NETTO

Indignação serôdia

UM DOS aspectos mais desoladores do panorama brasileiro é a manifestação explícita de desilusão revelada por destacados membros do que se supunha ser a nossa "intelligentsia". Tidos e havidos como "democratas radicais", recusam agora, raivosamente, os resultados das pesquisas eleitorais. Estas parecem revelar que o "povo" já não os escuta e não os obedece. Pior, parece dar muito pouco valor aos seus rocamboles acadêmicos e aos tardios ataques de indignação e falsa moralidade.
É claro que a política sem ética é inaceitável e que os desvios morais jamais poderão ser perdoados. Mas é claro, também, que os diferentes protagonismos desses erros tendem a nivelar, aos "olhos do povo", as diferenças éticas. A compra de votos no Congresso para a aprovação da "reeleição sem desincompatibilização" parece que foi feita sem o conhecimento do senhor ex-presidente: foram os prefeitos e governadores que "convenceram" os deputados sem que ele soubesse! O "mensalão" também parece que foi feito sem que o atual presidente soubesse. A pequena diferença é que, no primeiro caso, o governo impediu a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar os fatos. No segundo, ela funcionou livremente...
Logo, a tardia indignação não tem origem nas igualmente condenáveis violações éticas a que a sociedade assistiu estarrecida. Esta percebe claramente que, escondidos na extemporânea indignação, estão, pura e simplesmente, o imenso narcisismo e a vaidade ferida diante da possibilidade de um triste e final "despacho" para a história... O inconformismo dos intelectuais e suas novas dúvidas sobre a inteligência do "povo" ignoram um fato elementar, estatisticamente comprovado. Recentíssima pesquisa que compara o governo de FHC com o de Lula perguntou se a economia do país (na opinião do consultado) havia melhorado, ficado igual ou piorado. Teve como resposta o seguinte:
A sociedade percebeu o infeliz nivelamento ético, que agora se tenta diferenciar por uma indignação serôdia e oportunista e levou a discussão para o campo pobre da economia. Não há, portanto, nenhuma razão objetiva para que os nossos ex-quase intelectuais deixem de confiar na intuição do "povo", agora sociologicamente classificado por eles como a "massa dos não-informados"...


dep.delfimnetto@camara.gov.br

ANTONIO DELFIM NETTO
escreve às quartas-feiras nesta coluna.


Texto Anterior: Rio de Janeiro - Sergio Costa: Consumação máxima
Próximo Texto: Frases

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.