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ANTONIO DELFIM NETTO
Indignação serôdia
UM DOS aspectos mais desoladores do panorama brasileiro é a manifestação explícita de desilusão revelada por destacados membros do que se supunha ser a nossa "intelligentsia". Tidos e havidos como "democratas
radicais", recusam agora, raivosamente, os resultados das pesquisas
eleitorais. Estas parecem revelar
que o "povo" já não os escuta e não
os obedece. Pior, parece dar muito
pouco valor aos seus rocamboles
acadêmicos e aos tardios ataques
de indignação e falsa moralidade.
É claro que a política sem ética é
inaceitável e que os desvios morais
jamais poderão ser perdoados. Mas
é claro, também, que os diferentes
protagonismos desses erros tendem a nivelar, aos "olhos do povo",
as diferenças éticas. A compra de
votos no Congresso para a aprovação da "reeleição sem desincompatibilização" parece que foi feita
sem o conhecimento do senhor ex-presidente: foram os prefeitos e governadores que "convenceram" os
deputados sem que ele soubesse! O
"mensalão" também parece que foi
feito sem que o atual presidente
soubesse. A pequena diferença é
que, no primeiro caso, o governo
impediu a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito
para apurar os fatos. No segundo,
ela funcionou livremente...
Logo, a tardia indignação não
tem origem nas igualmente condenáveis violações éticas a que a sociedade assistiu estarrecida. Esta
percebe claramente que, escondidos na extemporânea indignação,
estão, pura e simplesmente, o
imenso narcisismo e a vaidade ferida diante da possibilidade de um
triste e final "despacho" para a história...
O inconformismo dos intelectuais e suas novas dúvidas sobre a
inteligência do "povo" ignoram um
fato elementar, estatisticamente
comprovado. Recentíssima pesquisa que compara o governo de
FHC com o de Lula perguntou se a
economia do país (na opinião do
consultado) havia melhorado, ficado igual ou piorado. Teve como resposta o seguinte:
A sociedade percebeu o infeliz
nivelamento ético, que agora se
tenta diferenciar por uma indignação serôdia e oportunista e levou a
discussão para o campo pobre da
economia. Não há, portanto, nenhuma razão objetiva para que os
nossos ex-quase intelectuais deixem de confiar na intuição do "povo", agora sociologicamente classificado por eles como a "massa dos
não-informados"...
dep.delfimnetto@camara.gov.br
ANTONIO DELFIM NETTO escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
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