São Paulo, quarta-feira, 13 de setembro de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Conselho aos candidatos

ISRAEL KLABIN

Não ouvi de nenhum dos candidatos um projeto com credibilidade para o desenvolvimento sustentável de longo prazo

ENTRE OS ensinamentos paternos, guardo alguns que são preciosos e que poderiam servir muito bem para direcionar os candidatos à Presidência da República e suas coortes. Dizia-me ele: "Meu filho, conselho, só com metade à vista".
As prioridades dadas em seus discursos fazem dos nossos candidatos, todos eles, pouco críveis, distanciados de uma visão de esperança no futuro, lidando com crises setoriais que são lugares comuns e óbvios ululantes.
Reforma do campo, reforma da cidade, construção de estradas, reforma tarifária, reforma política... Não há um eleitor, mais ou menos politizado, que não saiba de cor tudo aquilo de que o país precisa.
No entanto, até agora, não ouvi de nenhum dos candidatos uma agenda para o futuro, um projeto com credibilidade para o desenvolvimento sustentável de longo prazo que resguarde para os pósteros a herança de acesso a recursos naturais finitos que hoje temos à nossa disposição.
Amanhã, seguramente, esses recursos faltarão -seja a água, seja o ar, sejam as florestas, seja a energia ou seja qualquer outro-, e só serão transferidos para o futuro por meio de um projeto economicamente viável, ambientalmente responsável e socialmente justo. Essa proposta seria a "metade à vista" que nós todos almejamos.
A ecologia -cujas raízes "eco" e "logos" significam organização da casa, ou seja, da própria vida de cada um de nós que moramos nesse planeta- não atingiu, nem de raspão, a programação de nenhum dos candidatos à Presidência da República.
E, no entanto, todas as outras assim chamadas prioridades perdem a sua importância perto da preliminar ecológica. Sem o "logos" da organização eficiente do uso de recursos naturais e do próprio homem nas suas diversas atividades, caminharemos, rapidamente, para um ciclo curto e destrutivo de uma economia predatória que tem sido alardeado pelos candidatos.
Os dois problemas ambientais mais importantes e de maior urgência que deveriam fazer parte essencial das propostas dos candidatos que pretendem chegar à Presidência da República seriam:
1) uma reforma profunda do atual modelo de governança do meio ambiente;
2) um estudo crítico de toda a legislação ambiental hoje existente no Brasil, que é confusa, contraditória, ineficiente e conducente, entre outras coisas, a altas taxas de corrupção oriunda de corruptos e de corruptores que encontram facilidade na legislação vigente.
Cada vez é mais claro que todas as agências governamentais de água, de energia elétrica e de petróleo -e tantas mais que possam existir- deveriam responder a uma lei maior de um órgão regulamentador, regulador e que possa monitorar as relações de sustentabilidade de todos os recursos naturais, sejam eles hídricos, sejam florestais, sejam energéticos ou sejam minerais.
Considerando todos os anacronismos contidos nas legislações brasileiras em vigor -da nossa Constituição Federal às leis e regulamentos de nível estadual e municipal-, é consciência coletiva para todos nós, ambientalistas, que a maior e mais urgente necessidade de modernização está na legislação ambiental.
Uma modernização que possa, definitivamente, dar uma visão de longo prazo para o projeto de desenvolvimento econômico, social e ambiental é o que desejamos que seja a promessa e a proposta maior de um futuro governo para o Brasil.


ISRAEL KLABIN, 79, engenheiro, pós-graduado pelo Instituto de Ciências Políticas (França), é presidente da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável e membro do conselho de administração da Klabin S/A. Foi prefeito do Rio de Janeiro (1979 a 1983).

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