São Paulo, sábado, 13 de outubro de 2007

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CLÓVIS ROSSI

Faltam 46

SÃO PAULO - Voltar ao Brasil revolta o estômago. Afinal, há um mês e seis dias escrevi neste mesmo espaço que Renan Calheiros era um cadáver insepulto. Cadáveres insepultos por tanto tempo fedem. Esse fedeu além da conta, porque 46 companheiros (cúmplices seria a palavra mais exata, certo?) resolveram deixar a putrefação acontecer à vista de todos naquele lúgubre plenário do Senado.
Refiro-me, como é óbvio, aos 40 senadores que o absolveram e aos seis que se abstiveram. Sim, cúmplices, porque se há motivos, agora, para pressioná-lo a se afastar, havia motivos antes para cassá-lo, por falta de decoro.
Nenhuma nova víscera podre foi exposta nesse período para justificar o surto tardio de decoro dos senadores que tardiamente se envolveram na operação licença.
Logo, o mau cheiro só será desfeito -se é que ainda dá tempo- se houver mais 46 renúncias.
Não haverá, eu sei. Essa turma, com pouquíssimas exceções, tem peroba no rosto, do mesmo jeito que Renan Calheiros -alguns até mais ainda.
Vão esperar que passe a onda, que um novo escândalo faça esquecer o escândalo do momento, e pronto.
Volta-se à vidinha boa de pai da pátria, na certeza de que os que terminam seu período em 2010 poderão tranqüilamente candidatar-se à reeleição que seguramente a obterão, como a obtiveram grande número de mensaleiros e de todos os que se envolvem em escândalos.
Calheiros talvez tenha exagerado na dose de cinismo e de uso de todos os instrumentos contra seus pares incômodos. Só por isso teve que se licenciar. Dificilmente voltará à presidência do Senado. Mas você se surpreenderá se voltar à cadeira de senador, de fininho, no escurinho, da mesma forma como foi inocentado no plenário?
Continuará insepulto. E já ninguém se incomodará muito com o cheiro. É o Brasil, afinal.


crossi@uol.com.br

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