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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Lula entre dois atos
SÃO PAULO - "Não tem nenhum
[outro] grande líder. No Brasil hoje
-e esse é um dado triste para o Brasil-, a única figura de dimensão nacional sou eu". Quem fala é Lula.
Está num jatinho que vai de Macapá a Belém, a cinco dias do segundo
turno das eleições de 2002. A cena
faz parte de "Entreatos", o documentário dos bastidores da campanha petista, dirigido por João Moreira Salles e lançado em 2004.
Se o diagnóstico já estava certo,
hoje parece ainda mais verdadeiro.
Até por isso, enquanto a biografia
romanceada de Lula, by Barretão,
não chega às telas, não perde tempo
quem se dispuser a assistir ao filme
em que o próprio candidato representa seu personagem.
Hoje, o que mais chama a atenção
em "Entreatos" é a capacidade que
Lula teve de sobreviver a seus coadjuvantes. Praticamente todos encolheram ou foram banidos do poder.
O protagonismo do presidente, em
contrapartida, só aumentou.
É curioso rever Mercadante, o
maior papagaio de pirata, usando a
câmera como um espelho, no qual
contempla seu ego irrevogável. Ou
lembrar de Zé Dirceu, para quem a
câmera parece sempre uma intrusa,
pondo em risco segredos & negócios de Estado. Deu no que deu.
Palocci, Gushiken, Duda Mendonça, Silvinho Pereira, Frei Betto,
Ricardo Kotscho -todos os que
aparecem ao redor de Lula de alguma forma fizeram água. Dilma, na
época, não existia politicamente. E
Delúbio, que existia até demais, não
surge em cena, quem sabe por isso.
Fica claro em "Entreatos" que
Lula já tinha perfeita noção de seu
tamanho histórico. Mas também fica patente que ninguém ali sabia
bem o que iria fazer no governo.
De certa forma, o enredo da comunhão nacional que vivemos hoje, cuja síntese apoteótica está na figura do próprio Lula (o filho do
Brasil), é uma criação do ator eclético e camaleônico que ele soube ser.
Quanto de ficção e quanto de realidade? Fernando Meirelles disse
há pouco que "Lula é o melhor ator,
não sei se o melhor presidente". Na
falta de um país, já temos um filme.
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