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VAGUINALDO MARINHEIRO
Crise e novíssima ordem mundial
DURANTE muitos anos, intelectuais previram o declínio
do império norte-americano. Alguns apostavam na China como a nova potência a desbancar os
EUA da função de ditar as normas
para o mundo político, econômico
e cultural. Agora, o consenso gira
em torno de outra tese: o mundo
será multipolar.
É nessa linha que se encaixa o recém-lançado "O Mundo Pós-Americano" (Companhia das Letras,
312 páginas, R$ 49), de Fareed Zakaria. Segundo o autor, estamos
passando por uma nova "mudança
de poder tectônica" que irá criar
uma novíssima ordem mundial.
Esqueça o declínio do império
americano. Os EUA continuarão a
ser por muito tempo a maior economia mundial e a única potência
militar, mas ocorrerá a "ascensão
do resto", que inclui China, Índia,
Brasil e outros emergentes.
O livro foi escrito antes do agravamento da crise mundial, quando
alguns ainda acreditavam na tese
do descolamento -a crise nos países ricos, diziam, não afetaria substancialmente os emergentes.
Isso caiu por terra. A China já
acusou o golpe com redução acentuada nas exportações, a Índia vai
pelo mesmo caminho e o Brasil cria
pacotes para evitar uma queda
grande do PIB no último trimestre
do ano e no início de 2009.
Mas será o suficiente para invalidar os argumentos de Zakaria?
Não. Pode, sim, adiar um pouco o
processo.
Previsões são sempre arriscadas,
mas o mais provável é que Brasil,
China e Índia continuem a crescer
mais que o resto do mundo quando
as coisas se normalizarem. Continuarão também a agregar mais e
mais pessoas à massa de consumidores e a representar um peso cada
vez maior no mercado global.
Como efeito, europeus e norte-americanos terão de rever parte da
sua arrogância e de aceitar novos
membros nos mecanismos de regulação internacional.
Como escreve Zakaria (um indiano radicado nos EUA que é colunista da "Newsweek" e editor da
edição internacional da revista),
esses mecanismos estão anacrônicos: o Conselho de Segurança da
ONU é composto pelos vitoriosos
de uma guerra que acabou há 60
anos; o G8 -que, nominalmente,
inclui as sete maiores economias
do mundo mais a Rússia- despreza a China, a quarta maior economia do planeta; e um acordo garante sempre a um europeu a presidência do FMI e a um norte-americano o comando do Banco Mundial. Isso ainda faz algum sentido?
Outra boa conseqüência desse
novo mundo, afirma Zakaria, será a
redução do antiamericanismo, que
chegou a níveis inimagináveis nos
anos Bush. "O mundo está mudando da raiva para a indiferença, do
antiamericanismo para o pós-americanismo", escreve.
Será otimismo demais? Talvez,
mas que bom que assim seja neste
tempo repleto de pessimismo.
VAGUINALDO MARINHEIRO é secretário de
Redação.
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