São Paulo, quarta-feira, 14 de março de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ANTONIO DELFIM NETTO

Fatos preocupantes

NA ÚLTIMA semana, assistimos a três fatos preocupantes. O primeiro foi a visita do presidente Bush, um gesto simbólico envolvido num diversionismo -a expansão do etanol- que pode ter grande futuro e que até agora tinha sido ignorado pelo governo. Ele colocou às claras o infantilismo da política externa norte-americana em relação aos países do "bem" da América do Sul. Mas não passou impune. A esquerda "jurássica", que insiste em resistir e ignorar a história (e a evolução do pensamento da esquerda esclarecida sobrevivente), fez questão de ir às ruas para, também, demonstrar o seu próprio infantilismo. Defendeu frenética e convictamente o atraso geral. Proclamou Chávez como emanação da "verdadeira democracia", em oposição ao governo tirânico e da "falsa democracia" que controla os EUA.
O segundo foi a mal disfarçada sugestão de que "precisamos de mais uma televisão estatal para compensar a liberdade do monopólio privado dos meios de informação". Ela devolveu à nossa memória um dos episódios mais ridículos dos que já envolveram a fina flor da intelectualidade paulista. Revela o cinismo, a fraude e a falta de entendimento que podem dominar mentes ilustres. Trata-se da entrevista que Sartre e Simone de Beauvoir deram à TV Excelsior de São Paulo em 1960, quando visitaram o Brasil. O relato (Folha de 12/6/2005) é de quem viria a ser um senhor intelectual, o professor Bento Prado Jr., uma das glórias do pensamento filosófico brasileiro que, infelizmente, nos deixou há pouco. Ei-la: "Folha: Como Sartre se comportou na entrevista à TV Excelsior? Prado Jr.: Na verdade, foi uma pseudo-entrevista. Antes de entrarmos no palco, Sartre e Simone nos comunicaram (sic) as perguntas que gostariam de responder.
Todas ordenadas na defesa da Argélia e de Cuba (...) O divertido é que me coube a seguinte pergunta, endereçada a Simone: "Cuba é uma ditadura?". Ela respondeu pela negativa, e com tanta violência que fez um espectador da platéia perguntar a meu amigo Jorge da Cunha Lima: "Quem é esse rapazinho reacionário?" (...) A entrevista teve três horas de duração, para espanto de Sartre, que não entendia como uma empresa capitalista (sic) perdesse tanto dinheiro (suspendendo seus programas) para dar lugar a uma pura propaganda do socialismo (sic)".
O terceiro foi a ressurreição da proposta de que o Parlamento entregue ao Executivo o seu poder de aprovar a consulta popular pelo plebiscito, um caminho promissor e seguro para a "democracia antropofágica".


contatodelfimnetto@uol.com.br

ANTONIO DELFIM NETTO
escreve às quartas-feiras nesta coluna.


Texto Anterior: Rio de Janeiro - Ruy Castro: Palas e poses
Próximo Texto: Frases

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.