São Paulo, quarta-feira, 14 de abril de 2010

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Editoriais

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Crime e pecado

AO DAR início à mais significativa reforma litúrgica e doutrinária da Igreja Católica em quatro séculos, o papa João 23 comparou o Concílio Vaticano 2º, na década de 1960, a janelas que se abrem numa sala escura e mal ventilada. O pontífice buscava modernizar uma instituição tradicionalmente votada ao segredo, ao culto da hierarquia e à intransparência.
Tido por muitos de seus críticos como o mais feroz dos contrarreformistas, o papa Bento 16 deu nesta semana uma contribuição ao trabalho iniciado por seu antecessor.
Com clareza inédita, a igreja reconheceu o caráter criminoso, passível de punição pela Justiça, dos atos de pedofilia de representantes do clero. Segundo as diretrizes publicadas pelo Vaticano em sua página na internet, casos suspeitos devem ser submetidos às autoridades laicas e, se cabível, levados aos tribunais.
A recomendação contrasta com o procedimento tradicional do Vaticano, muitas vezes refratário ao reconhecimento da autoridade secular sobre os integrantes da hierarquia católica.
A pedofilia, ainda que vista como um desvio condenável, era para a igreja antes um pecado do que uma infração à lei. Esse modo de abordar o problema não deixava de ser conveniente para a instituição -inclinada a acobertar escândalos e evitar danos a sua imagem.
A avalanche de denúncias públicas que se seguiu à divulgação de um relatório com 15 mil casos de abusos ocorridos em sete décadas, na Irlanda, pressionou o Vaticano a mudar de estratégia.
Não deixa de ser louvável, de todo modo, a perspectiva aberta por Bento 16 para que a própria Igreja Católica tome esses desvios pelo que realmente são -crimes que devem ser julgados segundo as leis humanas.


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