São Paulo, domingo, 14 de maio de 2000


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CAPITAL PARA CRESCER

Retomar o crescimento econômico tem sido um objetivo declarado do governo. Mas há muita diferença entre a recuperação de alguns índices de produção ou de vendas, o que se observa nesse momento, e uma autêntica retomada.
O PIB brasileiro cresceu 3,08% no primeiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período do ano passado, segundo o IBGE. Não se verificava um crescimento dessa ordem desde o segundo trimestre de 1997.
Há polêmica sobre o significado dessas estatísticas, que têm as condições adversas após a crise asiática como base de comparação. No entanto, a maior polêmica não é de cunho estatístico. O problema fundamental não está em quantificar a recuperação, mas, sim, nas medidas que precisam ser adotadas para que a recuperação se transforme numa retomada sustentável.
Nesse terreno, há muito que fazer e o governo faz menos que o necessário. Um dos principais obstáculos à autêntica retomada é de natureza financeira. Um país das dimensões do Brasil não tem como basear seu desenvolvimento apenas nos capitais externos, por mais importantes e indispensáveis que sejam.
Internamente, no entanto, o investimento e a poupança continuam insuficientes. Como indica o gráfico, a capacidade de poupar do país encontra-se estagnada há três décadas.
Houve bolhas de consumo, surtos de crescimento e apostas numa economia mais aberta, privatizada e integrada aos mercados financeiros internacionais. Mas o país fracassou no desafio de criar fontes domésticas para financiar o crescimento.
Os períodos de disponibilidade de capital externo foram mais curtos e frágeis do que, a cada rodada, esperavam os governantes de plantão.
Apesar das mudanças de moeda, da liquidação de bancos e da entrada de instituições estrangeiras, em 30 anos o país foi incapaz de criar um novo sistema financeiro.


O mercado de capitais brasileiro continua tímido, limitado na oferta de papéis no pregão da Bolsa de Valores de São Paulo e na demanda por ativos de risco. Grandes empresas passaram a se endividar e a emitir papéis nos mercados internacionais ou na Bolsa de Nova York.
O governo estuda, no momento, formas de fortalecer esses mercados. A Bovespa mobilizou a imaginação criadora de uma equipe de técnicos para sugerir um novo pregão, centrado em pequenas e médias empresas de alto crescimento ou voltadas para novas tecnologias. Uma nova Lei das Sociedades Anônimas, em exame no Congresso Nacional, também fortaleceria o mercado de capitais.
Embora louváveis, essas iniciativas esbarram num ambiente de taxas de juros ainda elevadas demais. Num sistema de leis que nem estão entre as piores do mundo em termos de formulação, mas que deixam muito a desejar no terreno da implementação. Na concentração de renda, uma das piores do planeta, o que certamente não prenuncia um aumento da poupança ou a democratização do mercado de capitais. E na insuficiência das mudanças já promovidas no sistema previdenciário do país.
Abre-se, portanto, um vazio entre a criatividade microeconômica, presente em propostas originais como a que a Bovespa examina, e a precariedade das condições macroeconômicas, que limitam a diversificação dos investimentos e asfixiam a formação da poupança doméstica.
Por mais criativas que sejam as propostas setoriais ou microeconômicas, elas correm um risco elevado de soçobrar enquanto o governo brasileiro continuar tímido na reforma das estruturas econômicas antigas.


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