São Paulo, segunda-feira, 14 de maio de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ALBA ZALUAR

Guerra de confete

EM SHOW MUSICAL feito de marchinhas de Carnaval no Rio de Janeiro, ouvi uma deliciosa canção que comparava a Europa dos anos 40 com o Brasil. Dizia que enquanto lá a guerra matava tantos, aqui só tinha guerra... de confete. Quanta saudade daquele Brasil! Mas o que foi mesmo que aconteceu?
Recebemos tantos refugiados, principalmente judeus, daquele período terrível da história européia. Juntamos judeus e árabes nas ruas de comércio das nossas principais cidades. Negociamos e usamos diplomacia para resolver questões econômicas e políticas com os nossos vizinhos.
E só competimos fervorosamente com eles nos campos de futebol. Nossos jogadores e nossa música criada aqui, com a qual festejamos e brincamos, deu-nos passagem para o mundo. Foi essa mistura que nos fez tão criativos e divertidos.
E agora, Josés e Joões brasileiros? O que está acontecendo com nossa alma alegre e brincalhona? Com a nossa capacidade de tolerar e aceitar o diferente? Para começar os nomes mudaram. E agora, Uelintons, Denilsons e Uesleis brasileiros? Vocês ainda se divertem juntando pessoas de todas as cores, sexos e idades como ainda acontece no choro, no maracatu, xaxado, frevo, afoxé, vanerão e samba? Em outros países é impossível encontrar o que se vê toda noite na Lapa ou na balada paulista. Na Inglaterra, turmas de idade e de sexo diferentes não se misturam. Bandos de jovens do sexo masculino saem para brigar, bater ou quebrar.
Exatamente o que acontece com os jovens no baile funk do Rio de Janeiro e em alguns eventos do hip hop em São Paulo. O tumulto na praça da Sé no último fim de semana não parecia coisa nossa. Durante o Carnaval e a festa de fim de ano, a criminalidade se reduz quase a zero naquela cidade considerada uma das mais violentas do país. E a Polícia Militar está em todas.
Esses jovens vulneráveis, movidos a ressentimento, orgulham-se de serem machões durões e de fazerem guerra para valer. Matam-se entre si e matam os outros também. É a tal da hipermasculinidade ou a masculinidade exibicionista, exagerada, uma exibição espetacular de protesto masculino.
São três seus traços: atitudes grosseiras para com as mulheres; agressão e domínio considerados sinal de virilidade; e o perigo como excitante. A empatia, o cuidado e a compreensão, sentimentos e atitudes femininas, não são vistos como de homens de verdade, homens que matam por qualquer desafio. Afastem de nossos jovens vulneráveis e nossos policiais militares, este cálice mortal.
Alguma coisa nossa era melhor no país do Carnaval.


ALBA ZALUAR escreve às segundas-feiras nesta coluna.


Texto Anterior: Rio de Janeiro - Sergio Costa: No rastro de Ratzinger
Próximo Texto: Frases

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.