São Paulo, segunda-feira, 14 de maio de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

SERGIO COSTA

No rastro de Ratzinger

RIO DE JANEIRO - Com Bento 16, roga-se tenha tomado o caminho de volta à Santa Sé um conjunto de discussões bizantinas que estiveram em cartaz nas últimas semanas. Debates que estariam mais bem situados, no mínimo, em outro início de século: o passado.
Sobre aborto, por exemplo. O ministro José Gomes Temporão, com toda sua tradição familiar luso-católica, foi a voz da lucidez. É tema para ser visto com bem mais delicadeza do que andou sendo tratado. O Estado não assume o problema, mas o mercado há muito o absorveu. Quem, em qualquer classe, não sabe onde se faz aborto na sua cidade? E a que preço? O mais caro, talvez, seja o da pura hipocrisia.
A questão a ser encarada é de saúde pública. Pais, mães, avós, tias, filhas adolescentes, sogras -boas ou más- têm decidido por si, independentemente de lei ou crença, o rumo a tomar em caso de gravidez de risco, inoportuna ou incompatível com orçamentos e perspectivas familiares. Estado e igreja fecham os olhos. Quem se responsabiliza?
Outros temas tratados com lupa até ontem, como sexualidade, castidade, separação de casais ou mesmo o "ficar" da garotada, dão até preguiça -ou tédio. Soam desrespeitosos às conquistas de liberdades individuais e coletivas dos anos 60, 70, 80... O mundo gira.
Aliás, "ficar" já foi. O que meninos e meninas conjugam e colecionam é o verbo "pegar". Se algo lhes falta, é melhor qualidade em educação (sexual inclusive). A Igreja Católica não anda vazia à toa. Além de minimizar o discurso social, parece sofrer de incapacidade crônica para atender a demandas existenciais em tempo real. Não precisa distribuir camisinhas, mas condenar seu uso na era da Aids e de outras DSTs? Alguém mais sensato ousaria: "Perdoai-vos, Senhor. Pois eles não sabem o que fazem". Muitos, parecem, há séculos.


Texto Anterior: Brasília - Fernando Rodrigues: O papa e os brasileiros
Próximo Texto: Alba Zaluar: Guerra de confete
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.