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TENDÊNCIAS/DEBATES
A Unasul pode desempenhar papel relevante
nas relações entre Colômbia e Venezuela?
NÃO
O problema são as Farc
AMAURY DE SOUZA
A julgar por iniciativas recentes,
pode-se responder com elevada
probabilidade de acerto que a Unasul (União de Nações Sul-Americanas) dificilmente virá a desempenhar papel relevante nas relações
entre a Venezuela e Colômbia.
Trata-se de problema que persegue a Unasul desde o nascimento e
ao qual ela tem dado respostas desapontadoras.
O "animus laedendi" entre a Venezuela e a Colômbia já estava exacerbado quando a cúpula de chefes
de Estado em Brasília aprovou o
Tratado Constitutivo da nova entidade em 23 de maio de 2008.
Definida como "um espaço de integração e união", a Unasul ganhou personalidade jurídica internacional tardiamente. No dia 1º de
março, as Forças Armadas da Colômbia bombardearam um acampamento das Farc no Equador, matando Raúl Reyes, o ex-número
dois da guerrilha colombiana e pelo menos outros dez guerrilheiros.
A primeira reação veio não da
Unasul, mas dos países da Alternativa Bolivariana para as Américas
(Alba). O objetivo era isolar a Colômbia e caracterizá-la como um
país agressor.
Embora a Colômbia tivesse violado o território do Equador, e não o
da Venezuela, o presidente Hugo
Chávez ordenou o deslocamento de
tropas para a fronteira e rompeu relações com o governo do presidente
Álvaro Uribe, antes mesmo de o
presidente do Equador, Rafael
Corrrea, expulsar o embaixador da
Colômbia em Quito.
Quem desarmou uma crise diplomática que poderia tomar rumos
belicosos foi a velha e desacreditada Organização dos Estados Americanos (OEA), a quem o presidente
Correa solicitou apoio.
Reunida em tempo habilíssimo,
a OEA condenou a Colômbia pela
violação da soberania territorial do
Equador, mas sem lhe atribuir a
condição de país agressor.
A segunda vez que a Unasul foi
chamada a se pronunciar sobre as
relações entre os dois países foi na
cúpula de Bariloche, em 28 de agosto de 2009. O prato de resistência
foi a renovação do acordo militar
entre a Colômbia e os Estados Unidos, concedendo a militares norte-americanos o acesso a bases colombianas para apoiar o combate ao
narcotráfico e ao terrorismo.
Para impedir que a reunião terminasse em retumbante fracasso,
prevaleceu a decisão de respeitar a
soberania colombiana de permitir o
uso de suas bases.
Em represália, Chávez suspendeu os laços comerciais com a Colômbia, com resultados desastrosos para comércio bilateral.
A última crise é bem mais recente. Duas semanas antes de passar a
faixa presidencial ao sucessor, em 7
de agosto de 2010, o presidente Álvaro Uribe denunciou na OEA a
existência de acampamentos de
guerrilheiros das Farc na Venezuela, sob proteção do governo.
Ato contínuo, o presidente Chávez rompeu relações diplomáticas
com a Colômbia e reforçou as tropas militares na fronteira. A Unasul
ofereceu os préstimos, mas o presidente eleito, Juan Manuel Santos,
agradeceu a oferta de mediação e
disse preferir "o diálogo franco e direto, e o mais rápido possível" com
o presidente Chávez.
A razão do desempenho medíocre da Unasul é sua relutância em
reconhecer que as Farc são o epicentro do conflito entre a Colômbia
e a Venezuela. As Farc estavam
acampadas no Equador e há indícios seguros de que recebem abrigo
na Venezuela. São um problema
não apenas na região andina, mas
sua influência desagregadora espraia-se pelo continente.
Tem razão Álvaro Uribe ao dizer
que a colaboração de seus vizinhos
da Unasul tem se resumido a uma
"solidariedade retórica". Até porque não são poucos os que teimam
em designar as Farc como "movimento insurgente" e, em última
instância, politicamente legítimo.
AMAURY DE SOUZA é doutor em ciência política
pelo Massachusetts Institute of Technology (EUA) e
sócio-diretor da MCM Consultores Associados. É
autor do livro "A Agenda Internacional do Brasil: A
Política Externa Brasileira de FHC a Lula".
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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