São Paulo, quarta-feira, 14 de setembro de 2011

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Segurança pública e direitos humanos

OSCAR VILHENA VIEIRA, RENATO SÉRGIO DE LIMA E THEO DIAS


O debate sobre a questão criminal é distorcido quando se antagoniza os imperativos dos direitos humanos e os da segurança pública

Em coluna na Folha ("A miséria da sociologia", de 29/8), Vinicius Mota interpreta a manifestação de leitores a favor de ações policiais violentas como decorrência do fracasso do "pensamento acadêmico-ongueiro dos direitos humanos", que relativizaria a importância da responsabilidade individual pelo delito, desconsiderando a importância da repressão penal.
O diagnóstico nos parece equivocado. Conforme pesquisa da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, cresce o apoio aos direitos humanos, especialmente entre a população jovem e mais bem-educada. Por outro lado, os avanços, ainda que tímidos, na contenção da violência policial em São Paulo decorrem, em boa parte, do trabalho de organizações da sociedade civil na denúncia de abusos e no fortalecimento de uma cultura dos direitos, dentro e fora da polícia.
Polícia é instituição fundamental numa democracia. Submetê-la a controle e transparência é fator central para alcançarmos novo patamar civilizatório. A alternativa aos direitos humanos na segurança pública é o modelo "Rota na rua", da polícia que atira antes de perguntar, em inocentes e culpados.
As experiências bem-sucedidas de redução da criminalidade têm sido as capazes de mobilizar a participação efetiva das diversas instituições e dos cidadãos no processo de identificação e gestão dos problemas. Observa-se, em diversos Estados, produtiva aproximação entre integrantes do mundo "acadêmico-ongueiro" e policiais comprometidos com o respeito à lei.
Mas política de segurança participativa não se sustenta com polícia corrupta e violenta. Sem honestidade, profissionalismo e transparência, a polícia não adquire o respeito e a confiança da população. Sem confiança, não há eficiência.
Consolida-se, no Brasil e no mundo, uma nova cultura progressista de prevenção criminal, caracterizada pela diversificação das respostas sociais e governamentais aos problemas do crime e da insegurança. Não há ator social que não possua responsabilidade na gestão da segurança do espaço urbano.
A eficácia da resposta repressiva depende de sua capacidade de articulação com outros espaços de intervenção, nas áreas de educação, planejamento urbano, saúde, regulação bancária, etc. Quando se avalia o êxito das experiências de Bogotá ou Medellín, medidas como implantação de ciclovias e bibliotecas, educação no trânsito e aprimoramento da repressão penal são colocadas no mesmo patamar.
O debate público sobre a questão criminal é distorcido quando se antagoniza os imperativos dos direitos humanos e os da segurança pública. A responsabilidade do Estado é produzir políticas públicas de segurança dentro da legalidade. As organizações de direitos humanos têm por missão contribuir para a ampliação do respeito aos direitos, e uma de suas estratégias é denunciar aqueles que os violam.
Elas não podem ser recriminadas por fazê-lo. Pelo contrário, devem aumentar os seus esforços para demonstrar a falácia de discursos que, em nome do medo e da insegurança, concedem "permissões para matar". Polícia violenta é fator de insegurança social.

OSCAR VILHENA VIEIRA, professor e diretor da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas, é membro do Conselho da Conectas Direitos Humanos.
RENATO SÉRGIO DE LIMA, sociólogo, é secretário executivo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
THEO DIAS, advogado criminal, é professor da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas.

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