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CLÓVIS ROSSI
A ética e as moscas
MADRI - Agora que governos dos
países ricos adotaram pacotaços
para evitar o derretimento dos
mercados financeiros, inclusive estatizando parcialmente alguns bancos, vale voltar a uma entrevista
que a Folha publicou faz pouco
com o economista Eduardo Giannetti da Fonseca (mais filósofo que
economista, aliás).
Dizia Giannetti: "Quando os banqueiros estavam ganhando bilhões
de dólares, tudo era privado e particular. No momento em que esses
banqueiros e esses grandes aplicadores perdem bilhões, vem o governo e socializa, jogando a conta para
as gerações futuras. Tem alguma
coisa profundamente errada do
ponto de vista ético nesse sistema".
Sei que falar de ética "nesse sistema" soa hoje em dia fora de moda,
coisa de quem não entende o glamour do mundo do dinheiro. Mas
não há uma só palavra de Giannetti
que não corresponda à verdade, ao
sentido comum.
Aliás, li ontem, em um dos "trocentos" sites dedicados às finanças
inventados nos últimos anos, que
os financistas "se tornaram leprosos sociais". Mas duvido de que os
executivos das financeiras estejam
muito preocupados. Tornaram-se,
na verdade, uma "casta", conforme
a definição contida em uma bela reportagem publicada domingo pelo
jornal espanhol "El País".
Cito apenas um dado: o CEO
(chief-executive officer ou executivo-chefe) da Lehman Brothers, Richard Fuld, "cuja atuação levou à
desaparição o banco de investimento mais veterano dos EUA
(fundado em 1850), ganhava US$ 17
mil por hora". Repito: por hora.
Com uma hora de seu salário,
seria possível pagar um mês de salário mínimo a 38 trabalhadores
brasileiros.
Agora que se fala muito em reformar a gerência econômico-financeira do planeta, ou se introduz ao
menos um pouquinho de ética
"nesse sistema", ou o único que vai
mudar são as moscas.
crossi@uol.com.br
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