São Paulo, quinta-feira, 14 de novembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O TEATRO DE SADDAM

A aceitação pelo Iraque da resolução que determina a volta dos inspetores de armas ao país ajuda a dissipar o clima de guerra iminente que se ia formando, principalmente nos mercados, mas nem de longe afasta a hipótese de um conflito, provavelmente no início de 2003.
É verdade que o Parlamento iraquiano havia recomendado ao governo a rejeição da resolução da ONU, que afirma que o Iraque deve se livrar de suas armas de destruição em massa ou enfrentar "sérias consequências", mas o Legislativo local é quase uma peça decorativa, que se dobra incondicionalmente aos interesses de Saddam Hussein. No caso, a recomendação serviu ao gosto do ditador pelo suspense e pelo teatro. Também pode ter tido a função de indicar para o público interno que o governo considera a resolução uma ingerência indevida, mas que vai ceder a ela para evitar uma nova guerra.
Saddam Hussein já demonstrou em outras ocasiões que não é louco. Ao contrário, tem um notável sentido de autopreservação. Tentará ganhar o máximo de tempo e dificilmente dará um pretexto para os EUA atacarem. Como já ocorreu antes, deverá fingir que colabora com a ONU, como exige a resolução, mas, paralelamente, poderá criar vários obstáculos, como manifestações populares "espontâneas" contra o trabalho dos inspetores de armas.
O presidente dos EUA, George W. Bush, que parece disposto a ir até o fim para depor Saddam Hussein, provavelmente terá de arcar com o ônus de ir à guerra por conta de uma violação menor, que muitos países prefeririam deixar passar.
Se de fato cair, Saddam Hussein não deixará saudades, e a ONU terá, mais uma vez, cedido à força dos EUA. O lamentável em todo esse episódio é que, desta vez, o mundo terá se dobrado muito mais ao que parece ser um capricho do presidente Bush do que a uma necessidade estratégica real de Washington. Por que o Iraque e não a Coréia do Norte, que admite possuir armas nucleares?


Texto Anterior: Editoriais: CAUTELA COM OS JUROS
Próximo Texto: Editoriais: DESASTRE NO ENEM

Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.