São Paulo, quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

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No século passado

Com a Lei do Saneamento aprovada na Câmara, país caminha para acelerar despesas nessa área estratégica

APÓS DÉCADAS de ausência de diretrizes regulatórias mínimas para o setor, a Câmara dos Deputados finalmente aprovou, na terça-feira, o projeto da Lei do Saneamento Básico. O texto que vai à sanção presidencial -já passara pelo Senado- é uma etapa necessária rumo à desejada universalização do abastecimento de água e da coleta de esgoto no país.
Mais da metade dos domicílios do país ainda não está ligada à rede de esgotamento sanitário. Em torno de 35 milhões de pessoas que vivem nas cidades não têm acesso nem mesmo a fossas sépticas. Se a cobertura do abastecimento de água é maior, também se contam às dezenas de milhões os que não usufruem de água potável de qualidade em seus lares.
Há uma carência crônica de gastos em saneamento básico no Brasil. Sufocadas as contas públicas, a opção por privatizar os serviços tem sido usada timidamente e esbarra na falta de renda da população. O déficit de cobertura no setor -como ocorre também na habitação- se concentra na faixa dos brasileiros cuja família passa o mês com no máximo R$ 1.750 (70% da população).
Além disso, a carência de regras estáveis inibe a atração de capital privado e a expansão do investimento de empresas estatais em saneamento. A mobilização de volumes gigantescos de recursos -requisito para obras de saneamento básico- necessita de um horizonte institucional seguro durante décadas, pois é apenas no longo prazo que o investimento será remunerado.
A Lei do Saneamento traz respostas promissoras para a dissolução desses entraves. Em primeiro lugar, concede um incentivo tributário relevante ao investimento: despesas com obras poderão ser abatidas da Cofins e do PIS/Pasep das empresas.
A renúncia fiscal, estimada em até R$ 2,5 bilhões/ano, é justa nesse caso por sustentar um gasto nobre, que aumenta o emprego e o bem-estar dos mais pobres bem como as despesas globais com investimento no país. O saneamento básico, vale lembrar, também seria beneficiado pela medida em estudo no governo de destinar R$ 5 bilhões do FGTS para a infra-estrutura.
Metas nacionais e regionais de universalização e outras diretrizes para o setor, de acordo com a nova legislação, constarão do Plano Nacional de Saneamento Básico, com horizonte de 20 anos. O projeto aprovado pelos deputados também obriga, na prática, os titulares do serviço (Estados e municípios) a criar agências reguladoras autônomas para, entre outras atribuições, definir tarifas e arbitrar conflitos entre empresas e usuários.
A nova lei, no entanto, não toca numa questão importante para clarear o horizonte do investimento no setor. Nas regiões metropolitanas, existe uma disputa entre municípios e Estados para saber de quem é o poder titular sobre o saneamento básico. Os parlamentares preferiram deixar a resposta ao Supremo Tribunal Federal, que está para pronunciar-se sobre o assunto.
Espera-se que os ministros da corte se sensibilizem pelo momento frutífero de debates e inovações na área da infra-estrutura e dirimam logo essa dúvida crucial. Trata-se de acelerar a resolução de um problema que, vergonhosamente, deixamos sobreviver ao século 20.


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