São Paulo, quarta-feira, 15 de fevereiro de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

TV aberta: a evolução tecnológica é agora

FERNANDO BITTENCOURT

Se fosse possível trazer o primeiro televisor que foi vendido no Brasil há mais de 55 anos e colocá-lo em operação hoje, ele funcionaria normalmente, recebendo todos os canais de televisão aberta.


Quem inicialmente não puder comprar os novos aparelhos digitais continuará com a TV analógica normalmente


A televisão aberta, pelas suas características de comunicação de massa e pela responsabilidade de atender gratuitamente e sem discriminação a população de todas as classes sociais, tem o compromisso de manter a sua tecnologia sempre compatível para proteger o investimento do consumidor.
A única alteração tecnológica que houve ao longo desses 55 anos foi a transição de preto-e-branco para cores, na década de 70. Cientistas e engenheiros foram então obrigados a desenvolver uma engenhosa tecnologia de cores compatível com os aparelhos preto-e-branco daquela época.
Dessa forma, os aparelhos preto-e-branco continuaram recebendo as transmissões, mesmo quando estas eram coloridas, não onerando os que não podiam comprar os primeiros televisores em cores.
Hoje, enquanto todas as outras mídias já são digitais, a televisão aberta permanece, como há 55 anos, analógica.
Estamos agora, finalmente, no limiar da transição para a TV digital. Como não será possível dessa vez manter a compatibilidade, a solução será iniciarmos a nova tecnologia em novos canais de televisão. Esses novos canais transmitirão digitalmente, com uma oferta de novidades tecnológicas, como a televisão de alta definição, a televisão em aparelhos portáteis e móveis.
O prazer em assistir televisão vai aumentar com a qualidade de cinema e com a interatividade, além das novidades de tê-la fora de casa, no carro, no ônibus, no aparelho portátil e no telefone celular.
Quem inicialmente não puder comprar os novos aparelhos digitais continuará com a televisão analógica normalmente. Quando toda a população de cada cidade já estiver assistindo aos canais digitais, então as transmissões analógicas serão encerradas.
O modelo da televisão aberta na era digital continuará sendo livre e gratuito, com o compromisso de preservar os gastos da população com os receptores digitais. Assim, o momento de escolha da melhor e mais avançada tecnologia é agora. A próxima oportunidade de transição tecnológica, quem sabe, só daqui a três ou mais décadas.
Estamos acompanhando a evolução dos sistemas digitais existentes no mundo por meio de um grupo de trabalho da SET (Sociedade de Engenharia de Televisão e Telecomunicações). Os Estados Unidos e a Europa iniciaram suas transmissões em 1998. O Japão iniciou no ano de 2003.
Essas evoluções, constatadas e testadas no laboratório do Instituto Mackenzie em SP, têm sido pequenas e incrementais. Isso por quê? Pelas mesmas razões explicadas acima, cada sistema tem compromisso com os seus primeiros televisores lançados no primeiro dia de vendas. Não se pode implementar nenhuma alteração tecnológica não-compatível com esses primeiros receptores, o que, obviamente, é um limitador.
Esse compromisso com o passado permanecerá até o fim de cada uma das tecnologias digitais, como já mencionei, por três décadas ou mais.
Esse fenômeno não acontece com tecnologias de outras mídias ou de outros serviços.
O melhor exemplo é o da informática. Alguém tem um computador com mais de três ou quatro anos com um bom desempenho? Com certeza, a resposta é... Não! Algum computador com dez anos de uso funciona? A resposta é... "Foi para o lixo". Isso porque a evolução tecnológica da informática tem pouco ou nenhum compromisso com o passado. O mesmo acontece com outros aparelhos.
O sistema de som nas últimas décadas já passou do LP e da fita para o minidisc e para o CD. Estamos na era do ipod. Com certeza, virão outros . Ou compramos os aparelhos mais avançados ou ficamos com os obsoletos até eles se tornarem sem uso.
Assim, pelo exposto, o aspecto mais importante a ser observado na definição do sistema de televisão digital para o Brasil é, sim, a tecnologia e o que ela pode oferecer de vantagens às emissoras, ao consumidor e aos fabricantes.
É uma ilusão acharmos que as características e deficiências tecnológicas dos sistemas existentes (americano, europeu e japonês) irão se alterar significativamente nas próximas décadas. Todos têm compromissos com os seus primeiros receptores vendidos.
Por tudo já estudado e testado no Brasil por meio da SET, do Instituto Mackenzie e todos os estudos sérios realizados pelos consórcios estabelecidos pelo projeto SBTVD (Sistema Brasileiro de TV Digital) criado pelo governo, nossa conclusão é que o sistema ISDB-T adotado no Japão é o mais avançado tecnologicamente e o único a oferecer as características de alta definição, mobilidade e portabilidade no mesmo canal de televisão, como é desejo das emissoras e o melhor para o mercado consumidor.
Como o sistema ISDB-T é um sistema já desenvolvido há oito anos, há propostas a partir dos estudos brasileiros para sua atualização tecnológica que serão incorporadas ao sistema para a adoção no Brasil e, possivelmente, em outros países da América do Sul.
Teremos um sistema de TV digital compatível com a qualidade e a importância da televisão brasileira, uma das melhores televisões abertas do mundo.

Fernando Bittencourt, 59, engenheiro, é diretor da Central Globo de Engenharia e coordenador do grupo Set/Abert (Sociedade Brasileira de Engenharia de Televisão e Telecomunicações/ Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e TV) para estudar e planejar a introdução da TV digital no Brasil.


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