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ELIANE CANTANHÊDE
Farsa e realidade
BRASÍLIA - Estamos todos morrendo de vergonha com a reviravolta do caso Paula Oliveira: ninguém
viu skinhead nenhum, há possibilidade de automutilação, e a moça
nem sequer estava grávida.
Lula chegou a berrar contra "tamanha violência", Amorim acusou
"evidências de xenofobia", Marcondes Gadelha, da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, protestou na embaixada da Suíça, TVs e
jornais encheram-se de indignação,
e grupos brasileiros estavam prontos para ir às ruas, hoje, em Zurique.
Um vexame! O que seria selvageria
neonazista está confluindo para
uma patologia individual, em que a
vítima é também tristemente ré.
A reviravolta, porém, não muda
os efeitos de uma crise que começou na maior economia e se alastra
dramaticamente. Com Alemanha,
Reino Unido, Holanda, Portugal,
Espanha e Itália em recessão e registrando aumento de desemprego,
a xenofobia perde o pudor e emerge. Com ou sem skinheads, a história de Paula toca numa ferida tão
real que habitava e explodiu no inconsciente da moça. E no nosso.
O Brasil foi do ataque à defensiva,
depois de autoridades, imprensa e
cidadãos suíços reclamarem retratações. O que, além de constrangedor, enfraquece futuras investidas
em defesa de brasileiros agredidos e
humilhados no mundo desenvolvido, mas não elimina a essência de
toda a discussão: a resistência crescente e agressiva aos imigrantes de
países emergentes ou periféricos.
Se os cortes em Paula são superficiais, lineares e femininos demais
para terem sido feitos por brutais
skinheads, eles não eliminam as dores dos brasileiros humilhados em
aeroportos espanhóis, sem banho,
sem ressarcimentos e até sem dentes, perdidos a socos policiais.
Paula pode ter sido um erro, mas
o erro maior está lá. Por que foi tão
fácil inventar e acreditar num ataque de skinheads? Porque há quem
não creia em xenofobia, mas que ela
existe, existe. E tende a piorar.
elianec@uol.com.br
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