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MARINA SILVA
Além de si mesmo
A LIBERDADE , um dos direitos básicos da vida, é algo tão
visceral e tão intrínseco à
condição humana que, em determinadas situações, não poder usufruí-la é como tornar-se um morto-vivo, individual e coletivamente.
Quando algumas pessoas chegam ao ponto de subtrair aquilo
que é essencial ao corpo, que é o
próprio alimento, estão usando o
que lhes resta para apontar para
essa morte social anterior.
A palavra é tão importante quanto o pão. Há outros alimentos que
são vitais, a que chamamos de direitos humanos, que incluem a liberdade de expressar opinião, a liberdade de divergir. O direito de
não ser tiranizado.
Ainda que a greve de fome seja
um ato extremo, muitos encontram nela a última forma de protesto. Por meio dela encerraram-se
injustiças, salvaram-se vidas e despertaram-se a consciência e a solidariedade. Historicamente ganhou
destaque mundial com Gandhi e
sua batalha contra a opressão colonial inglesa na Índia.
Embora meus códigos pessoais e
religiosos sejam contrários à ideia
de dispor da vida, não há como desconsiderar sua semelhança com o
sacrifício de tantos mártires da humanidade que, em defesa de seus
ideais e causas, chegaram ao extremo de perder a própria vida.
Para G. K. Chesterton, o mártir
se preocupa tanto com alguma coisa além de si mesmo que se esquece
de sua vida pessoal. Em suas palavras, o mártir é um portador de
princípios e atitudes nobres "porque morre para que alguma coisa
viva".
Nesse caso, o sacrifício acaba desencadeando um processo inescapável de interação, de corresponsabilidade, não só pela vida de uma
pessoa, mas pela sobrevivência de
valores basilares pactuados pela
humanidade. É por isso que a política da não ingerência de um país
nos assuntos internos de outro não
pode significar a relativização de
certos valores, mesmo que defendê-los possa nos criar alguns incômodos. Igualmente inaceitável é
desqualificar o expediente e quem
está expondo a ferida.
Uma forma de ser respeitoso e
solidário é, às vezes, mostrar que
nem sempre aqueles que são objeto de nossa lealdade estão certos.
Nossa opinião sincera é também
uma forma de lealdade.
Quando as contradições são empurradas para debaixo do tapete,
em nome de quaisquer alinhamentos incondicionais, não existe parceria, e sim uma relação empobrecida de assimilação. Nesse caso, a
cumplicidade mata, por inanição, a
coragem para mudar e tornar o
mundo melhor, onde quer que isso
se coloque como desafio.
contatomarinasilva@uol.com.br
MARINA SILVA escreve às segundas-feiras nesta coluna.
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