São Paulo, quarta-feira, 15 de abril de 2009

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Conspiração fiscal

Em vez de ater-se a ajuda limitada, Planalto faz ação eleitoreira, promete R$ 1 bilhão a prefeitos e dá prêmio à gastança

"ESQUEÇAM o que escrevi na Carta aos Brasileiros." Eis o que deveria dizer hoje o presidente Lula, quase sete anos após divulgar o documento que contribuiu para dar-lhe o primeiro mandato, com a promessa da responsabilidade fiscal feita em junho de 2002.
A decisão do Planalto de ceder à pressão dos prefeitos e torrar R$ 1 bilhão do Orçamento da União para compensá-los pela perda de arrecadação premia a gastança imprevidente nos anos de crescimento. Adepto da expansão da máquina pública, Lula chancela o comportamento perdulário de prefeitos e governadores -inclusive os de oposição. Sinaliza, ainda, que está disposto a tudo para carrear a gratidão de prefeitos em favor da ministra-aspirante Dilma Rousseff.
Coerência e lógica, de fato, não costumam ser o forte do presidente. Ontem, depois de dizer que a crise faz o governo federal perder arrecadação e que essa perda deve atingir a todos, Lula qualificou a benesse fiscal como "conquista extraordinária" dos prefeitos. Não resta dúvida de que se trata de algo extraordinário anunciar a perda de arrecadação para, em seguida, assumir o compromisso de manter o mesmo nível de repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) em 2008.
É razoável dar alguma compensação a municípios, pois parte da perda decorre de incentivos fiscais concedidos pelo governo federal, como a redução de IPI para veículos. Mas tal compensação teria de limitar-se a essa parcela da queda, e não ser indexada ao repasse do ano anterior.
A distribuição da fatia de 23,5% do IR e do IPI a que os municípios fazem jus, por meio do FPM, além disso, tem progredido nos últimos anos acima da inflação e do crescimento do PIB. Foram R$ 51,3 bilhões em 2008, 16% mais que no ano anterior (R$ 40, 1 bilhões, 12% mais que em 2006). Deveriam estar com os cofres bem forrados para enfrentar a tempestade.
Como demonstrou, contudo, reportagem de Gustavo Patu nesta Folha, domingo, governos municipais e estaduais copiam o padrão federal esbanjador no aumento de gastos com o funcionalismo -despesas em geral permanentes- acima da inflação. A União aumentou esse gasto em 26,2% em dois anos, enquanto o IPCA subia 10,6%. Os Estados avançaram 25,2%, e os governos das capitais, 26%.
A semelhança dos percentuais evidencia que se está diante de uma tendência verdadeiramente nacional e suprapartidária. O recorde de aumento nos gastos com pessoal nas capitais (48%) cabe à prefeita petista de Fortaleza, mas não faltam sócios tucanos e do DEM nesse clube -inclusive o governador paulista e aspirante à Presidência, José Serra (PSDB), com acréscimo de 25% na folha de pessoal.
Todos se irmanam na alegação de que os gastos subiram porque era necessário reajustar vencimentos achatados por governos anteriores. Mesmo que o argumento não fosse duvidoso, jamais poderia servir de justificativa para o governo federal adernar ainda mais um equilíbrio fiscal já ameaçado pela crise.


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