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Subsídio soberano
O MINISTRO Guido Mantega
inspirou-se no chefe e arriscou uma parábola para
explicar o fundo soberano que
pretende criar. "É como um cofrinho. Você tem o seu salário e
faz as suas despesas. No fim do
mês, o que sobrar vai ser colocado em um cofrinho". Mas não será um porquinho de cerâmica
qualquer; terá a missão, a crer no
titular da Fazenda, de "mobilizar
os interesses do país".
O cofrinho mobilizador possui,
contudo, peculiaridades que escaparam ao didatismo do ministro. Não há sobra de recursos no
orçamento público. O governo
toma da sociedade uma enormidade em impostos, reserva um
pouco -o superávit primário-
para pagar juros de sua dívida.
Mesmo assim não consegue arcar com todas as despesas da máquina pública. E faz mais dívida.
Como o governo não tem dinheiro sobrando, cada moeda
depositada no cofrinho terá de
ser tomada emprestada no mercado, a juros mínimos de 11,75%
ao ano -e subindo. As empresas
que o governo associar aos "interesses do país" poderão beneficiar-se dos empréstimos do novo
fundo no exterior.
Se as operações tiverem sucesso estrondoso, as aplicações do
cofrinho da Fazenda serão remuneradas a uma taxa de, no
máximo, 6% ao ano. A diferença
entre as duas taxas será bancada
pelo Tesouro. Em suma, os contribuintes brasileiros arcarão
com o subsídio soberano direcionado, não se sabe com que critérios, a um punhado de empresas.
Em vez de dar-se a invencionices, o governo deveria elevar a
meta do superávit primário. Reduzir gastos de custeio e aproveitar o excesso de arrecadação para abater mais dívida pública interna traria diversas vantagens:
diminuiria o custo financeiro do
governo e inibiria o ímpeto da
demanda doméstica, combatendo desequilíbrios na inflação, nas
contas externas e no câmbio.
A proposta de aumentar o superávit primário, de 3,8% do PIB
para até 5,5% do PIB, foi levada
ao presidente Lula pelo economista Luiz Gonzaga Belluzzo.
Bombardeada internamente por
assessores que não enxergam
um palmo à frente do nariz, feneceu. Mas o cofrinho da Fazenda
resistiu, e a sociedade foi convocada a financiar a aventura.
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