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CARLOS HEITOR CONY
Tábua de logaritmos
RIO DE JANEIRO - Nos últimos
tempos, por penitência ou por masoquismo, tenho ouvido palestras,
conferências e debates sobre variados assuntos sobre os quais nada
entendo. Pouco tenho aprendido,
mas sempre me distraio vendo a
reação das platéias.
Descobri que metade delas, de
uma forma ou de outra, cochila de
diversos modos. Alguns chegam a
ressonar, a cabeça tombada sobre o
peito, dando a impressão de que
aprovam o que está sendo dito. Outros aprendem a dormir de olhos
abertos -técnica na qual o finado
Magalhães Jr. era mestre, ajudado
pela natureza, que o fez estrábico
dos dois olhos.
Há, porém, os "punti luminosi"
de que Ezra Pound falava. Em qualquer situação, seja qual for o orador, seja qual for o assunto, ficam
atentos, eretos, marciais, como se
estivessem ouvindo um hino nacional imaginário -a imagem é do
Nelson Rodrigues.
Um desses pontos luminosos, segundo consta na ABL, foi o ministro
Ataulpho de Paiva, mestre do galanteio e das boas maneiras. Chegou ao
Supremo Federal sem ser jurista e à
Academia sem ter livro publicado.
Hoje é nome da avenida mais importante do Leblon, enquanto Machado de Assis tem uma rua mesquinha, escondida no Catete.
Ataulpho tinha um topete majestoso, que pintava de acaju, ninguém
sabia a sua idade, era celibatário e
rico. Sucesso absoluto nas rodas sociais, não perdia conferência, simpósio, palestra, debate, mesa-redonda ou quadrada. Duro na cadeira, aprovava antecipadamente tudo
o que orador dizia, lesse ele o catálogo de telefones ou a tábua de
logaritmos.
Reza a lenda que foi o autor do
convite para Getúlio Vargas entrar
na Academia. Vargas quis tirar o
corpo fora, alegando não haver vaga. Ataulpho respondeu: "Não seja
por isso, presidente, eu me suicido".
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