São Paulo, sábado, 15 de maio de 2010

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Prudência necessária

Anúncio de corte de despesas é um sinal de sensatez do governo, que enveredava pelo terreno do descontrole fiscal

DEPOIS DE UMA fase em que a adoção de medidas para enfrentar a crise econômica internacional serviu de licença para gastos descontrolados, o governo federal demonstra, enfim, estar preocupado com o desequilíbrio fiscal e as evidências de superaquecimento da economia.
A Fazenda anunciou um corte adicional de R$ 10 bilhões em despesas de custeio, que poderá ajudar a União a superar a meta de 3,3% do PIB para o superavit primário -a economia do setor público com vistas ao pagamento dos juros da dívida.
O novo congelamento de gastos soma-se aos R$ 21,8 bilhões anunciados em março, perfazendo um total de R$ 31,8 bilhões, cerca de 1% do PIB.
O valor é quase o mesmo dos investimentos vinculados ao Programa de Aceleração do Crescimento, que podem ser abatidos do cálculo do superavit. Se cumprir o prometido, o governo poderá agora alcançar o objetivo fiscal de maneira mais convincente, sem precisar recorrer ao desconto dos valores do PAC.
O anúncio veio em boa hora. Os cortes trazem uma salutar dose de sensatez para um ambiente de gestão das finanças públicas que parecia caminhar para o terreno da irresponsabilidade.
Desde sempre inclinado a aumentar despesas, o governo Lula nos últimos tempos ultrapassou os limites. Uma série de subterfúgios foi utilizada para fechar as contas de 2009, facilitar gastos e driblar a contabilidade oficial.
O mais "criativo" -e preocupante- deles foi a transferência de R$ 180 bilhões do Tesouro Nacional para o BNDES. Na mesma linha, editou-se medida provisória que permite o uso de recursos do chamado fundo soberano para capitalizar estatais, sem afetar o superavit primário.
O quadro tornou-se mais arriscado com a eclosão da crise europeia e com os sinais de que a retomada do crescimento da economia brasileira vinha de fato ocorrendo em ritmo muito forte, o que já levara o Banco Central a iniciar um processo de elevação da taxa básica de juros.
Embora os cortes previstos não sejam suficientes para alterar a direção restritiva da política monetária, podem representar um alívio. Os juros certamente continuarão em alta, mas sem o esforço fiscal seriam maiores as chances de que atingissem um patamar mais elevado -e mais nocivo para a economia.
Quanto à Europa, a montagem, às pressas, de um pacote de socorro de 750 bilhões (cerca de R$ 1,7 trilhão) não deixou dúvidas sobre a gravidade dos desequilíbrios fiscais em muitas economias do continente.
As dificuldades da Grécia lembram, aliás, momentos sombrios já enfrentados pelo Brasil em passado não muito distante. Mesmo fora do epicentro da crise, o governo brasileiro não poderia comportar-se como se nada tivesse acontecido.
Também são positivas, neste cenário, as indicações de que a Presidência dispõe-se a vetar os descalabros previdenciários aprovados pelo Congresso. A hora, de fato, exige prudência.


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